POVO APINAJÉ DEBATE PAPEL CONSTITUCIONAL DA FUNAI PARA OS POVOS INDÍGENAS
Participantes de reunião na aldeias São José. (foto: Antonio Veríssimo. Julho de 2016) |
No último sábado, dia 23/07/16
realizamos na aldeia São José na T.I. Apinajé reunião na qual tratamos sobre
assuntos internos e sobre as políticas públicas de governo, especialmente sobre
o papel constitucional da Fundação Nacional do Índio-FUNAI. A reunião contou
com as presenças de estudantes, professores, caciques, Agentes Indígenas de
Saúde-AIS, mulheres, idosos (as), membros conselheiros da União das Aldeias
Apinajé-Pempxà e demais lideranças.
Durante todo o dia debatemos com foco nas
questões territoriais, ambientais e sociais do povo Apinajé, com reflexões e analise
críticas sobre a responsabilidade do Governo Federal de fiscalizar proteger as
terras indígenas que são bens e patrimônio da União.
No final da tarde encerramos as conversas com alguns encaminhamentos: 1) a próxima Assembleia extraordinária da União das Aldeias Apinajé-Pempxà será realizada em agosto ou setembro na aldeia São José, em data à ser confirmada; 2) no dia 03 de agosto próximo participaremos de reunião no MPF-AGA em Araguaína para debater assuntos de interesse do povo Apinajé; 3) que na próxima Assembleia serão tratados sobre as mudanças na diretoria da União das Aldeias Apinajé-Pempxà, bem como será efetivada a posse do novo presidente dessa organização; 4) na próxima Assembleia também serão discutidos com as presenças de todos os caciques e lideranças, do MPF-AGA e da FUNAI sobre a entrada de evangélicos e outras seitas religiosas nas aldeias Apinajé; 5) finalmente elaboramos um manifesto de apoio à FUNAI e cobrando do Governo Federal o cumprimentos de preceitos e dispositivos constitucionais que declaram a responsabilidade e o dever do Estado brasileiro de fiscalizar e proteger os territórios indígenas. Leia o Manifesto na íntegra abaixo;
Plenária de reunião de caciques e lideranças Apinajé na aldeia São José. (foto: Antonio Veríssimo. Julho de 2016 |
MANIFESTO DO POVO APINAJÉ EM DEFESA DA FUNÇÃO CONSTITUCIONAL DA FUNAI
Nós caciques e lideranças Apinajé somando
mais de 50 pessoas reunidas no dia 23/07/2016 na aldeia São José, TI Apinajé,
município de Tocantinópolis-TO para discutir nossas questões internas e também tratar
sobre a conjuntura do atual governo e a implementação da Política Indigenista
no Brasil, viemos à público manifestar extrema preocupação com a situação de
total inoperância e abandono da Fundação Nacional do Índio-FUNAI/sede, de suas
CRs e CTLs, que de forma geral encontram se em condições precárias e sucateadas dificultando
e impedindo a efetivação das demarcações, a fiscalização e a proteção dos
territórios indígenas conforme determina os Arts 231 e 232 da Constituição
Federal do Brasil. Repudiamos com veemência essa campanha infame dos setores
conservadores que atuam no âmbito dos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário
contra nossos direitos constitucionais. Percebemos que muitos parlamentares
ligados as bancadas ruralistas e evangélicas estão agindo (nas sombras) de forma
articulada e agressiva dentro do parlamento brasileiro pautando e discutindo propostas
com a finalidade de mudar a constituição para retirar nossos direitos sociais,
culturais e ambientais. A Proposta de Emenda à Constituição PEC 215/2000
significa a real materialização desse retrocesso. Denunciamos que a tramitação
dessa Proposta de Emenda à Constituição PEC 215/2000 na Câmara dos Deputados
tem sido um fator determinante para agravamento dos conflitos no campo e o responsável
pelo aumento dos assassinatos de lideranças indígenas em áreas de conflitos.
Lamentavelmente o Governo Federal através do MJ e da Polícia Federal, Força
Nacional e das Forças Armadas não conseguem impedir essa onda de ataques e
massacres contra as lideranças indígenas que lutam por direitos humanos, pela
regularização fundiária e garantias territoriais no País. Assim contrariando os
preceitos de um Estado pluriétnico, multicultural, ambiental e biologicamente
diverso, os seguidos governos tem privilegiado um único setor dito “produtivo”,
que na realidade é o maior responsável pelo desmatamento da floresta Amazônica,
do Cerrado e da Mata Atlântica, o setor ruralista gera poucos empregos, promove
expulsão de famílias do campo para às cidades, sendo também responsável pela
grilagem de terras, trabalho escravo e provocador de violência no meio rural. Esses
fatos nunca são divulgados, ou são propositalmente manipulados e/ou ocultados
pela grande mídia financiada pelo agro. Os
recorrentes despejos violentos de famílias e as execuções de lideranças Guarani
Kaiowá no Estado de Mato Grosso do Sul; realidade que envergonha a sociedade
brasileira perante a opinião pública internacional, também não são noticiadas
pelas grandes redes. É inaceitável que setores ruralista estejam utilizando se de
expedientes midiáticos como as CPIs da FUNAI e do INCRA para tentar criar um
clima de constrangimentos, intimidações e ameaças, jogando a opinião pública
contra os servidores da FUNAI e do INCRA, contra as organizações indígenas e as
ONGS ambientalistas e indigenistas. Mas uma vez criticamos essa postura omissa e
irresponsável do Governo brasileiro que de forma conivente, submissa e
entreguista continua cedendo às pressões do agronegócio, das madeireiras, das mineradoras
e de outros invasores que pretendem continuar usurpando e alienando nossos
territórios para explorar economicamente de maneira predatória e criminosa nosso
patrimônio ambiental e cultural. Percebemos que esse Governo interino do Michel
Temer continua priorizando e seguindo religiosamente a pauta do setor ruralista;
composta por grandes fazendeiros e empresários, impondo à FUNAI/sede, as CRs e
CTLs essa situação caótica de total abandono e sucateamento; com cortes de
recursos e demissão de servidores. Essa atitude deixa claro que esse governo está
intimamente alinhado e comprometido com os valores, o pensamento e as práticas
do setor ruralista, cujo objetivo imediato é enfraquecer e esvaziar totalmente
o órgão indigenista, deixar as TIs desprotegidas e as comunidades na mira dos
capangas do agronegócio. Diante dessa situação de descaso e omissão
governamental declaramos que estamos nos organizando para efetivar por nossa
conta e risco o Monitoramento e a Proteção de nosso território demarcado e
regularizado, e que em razão dessa situação de conflito e ameaças constantes contra
nosso povo, se algum confronto violento que resulte em sequelas físicas e perdas
de vidas humanas vier ocorrer, o Estado brasileiro será mais uma vez formalmente
denunciado nos Tribunais Internacionais de defesa dos Direitos Humanos e na ONU.
Diante dos fatos expostos manifestamos nos seguintes termos:
1- que o governo brasileiro através do MJ-FUNAI/sede adotem
as providências orçamentárias e condições estruturais para que as
CR-Araguaia/Tocantins e CTL/Tocantinópolis efetivem a fiscalização e proteção
da Terra Indígena Apinajé, que encontra se parcialmente invadida;
2- que sejam adotadas pela FUNAI/sede,
CR-Araguaia/Tocantins de Palmas e CTL de Tocantinópolis medidas administrativas
e judiciais para retomada do processo de regularização fundiária da área
Apinajé II, no município de Tocantinópolis, afetada por desmatamento irregular
para plantio de eucaliptos;
3- que o Ministro Teori Zavascki relator da ADI 5312
ajuizada pelo PGR-Procurador Geral da República Dr. Rodrigo Janot que questiona
a constitucionalidade da Lei 2.713/2013 do Estado do Tocantins, leve a referida matéria
ao plenário do STF para julgamento e decisão definitiva por parte da Suprema Corte;
4- que sejam acatadas e cumpridas pelas autoridades
brasileiras as ordens e regramentos do direito internacional preconizados na
Convenção 169 da OIT e na Declaração do ONU sobre os direitos dos Povos Indígenas
das quais o Brasil é signatário;
5- que o IBAMA/Prev/Fogo inicie imediatamente na T.I.
Apinajé ações de prevenção e combate aos incêndios nas florestas e Cerrado, que
no momento estão se alastrando na Terra Apinajé ameaçando as aldeias;
6-que o Procurador da República Dr. Felipe Torres do
MPF-AGA no município de Araguaína adote medidas judiciais para impedir a
retomada de desmatamentos no entorno desta T.I. até que seja julgada a ADI 5312
ajuizada pelo PGR;
7- que nossas organizações e comunidades Apinajé sejam previamente
informadas e consultadas pelos empreendedores interessados quando se pretender implantar qualquer projeto que
afete nosso território e aldeias;
8-que não concordamos com o relaxamento e flexibilização
das Leis e regras para licenciamentos ambientais de projetos e empreendimentos
que irão afetar nossos territórios;
9- que é inaceitável a proposta de extinção do Programa
Mais Médicos, pedimos pela manutenção desses profissionais de saúde que atuam
nas aldeias;
10- que não
aceitamos a privatização da saúde indígena, considerando a saúde como um direito
fundamental do cidadão e um dever do Estado, também não concordamos com sua
municipalização.
Terra indígena Apinajé, 23 de julho de 2016