31 de jan. de 2019

POVO XERENTE

“De forma alguma vamos aceitar retrocessos em nossos direitos”, afirmam os Xerente e Krahô
Encontro realizado entre os dias 24 e 27 de janeiro reuniu mais de 180 lideranças e revela a preocupação dos povo indígenas frente às medidas adotadas pelo governo
O encontro reuniu mais de reuniu mais de 180 lideranças Xerente e Krahô. Foto: Cimi Tocantins
O encontro reuniu mais de 180 lideranças Xerente e Krahô. Foto: Cimi Tocantins
POR ASCOM/CIMI
Com o objetivo de defender seus território e os direitos indígenas garantidos pela Constituição, caciques e lideranças do povo Xerente e Krahô se reuniram para analisar e buscar caminhos, diante da atual conjuntura indigenista com o governo Jair Bolsonaro. O encontro foi realizado na aldeia Traíra, Terra Indígena Xerente, município de Tocantínia, a 70 km de Palmas (TO), entre os dias 24 a 27 de janeiro, e contou com a presença de pelo menos 180 indígenas.
“De forma alguma vamos aceitar retrocessos em nossos direitos”
Um das preocupações dos indígenas é as medidas adotadas pelos atual governo, os ataques à vida, cultura, territórios e direitos indígenas. Foto: Cimi Tocantins
Um das preocupações dos indígenas é as medidas adotadas pelos atual governo, os ataques à vida, cultura, territórios e direitos indígenas. Foto: Cimi Tocantins
“De forma alguma vamos aceitar retrocessos em nossos direitos”, foi o recado que veio a partir dos debates. Os indígenas manifestaram preocupação com as medidas adotadas pelos atual governo, assim como com os ataques à vida, cultura, territórios e direitos indígenas. “O fato de retirar a Funai do Ministério da Justiça e alocar no Ministério da Agricultura significa que o agronegócio vai paralisar todo processo de demarcação de terras indígenas, vai anular a demarcação das terras, e paralisar as terras que estão em processo de conclusão de demarcação”, aponta com preocupação Eliane Franco Martins, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Regional Goiás/Tocantins.
Outra questão relacionada à política indigenista, e que preocupa os Xerente e Krahô, se trata da proposta de arrendamento das terras indígenas para empresas do agronegócio, sobretudo dos setores agropecuário e da mineração.
“Não concordamos (também) com o presidente Jair Bolsonaro ao promover o preconceito e a violência contra os povos indígenas”
Só com mobilizações os indígenas conseguirão combater o retrocesso no tocante a seus direitos e territórios. Foto: Cimi Tocantins
Só com mobilizações os indígenas conseguirão combater o retrocesso no tocante a seus direitos e territórios. Foto: Cimi Tocantins
Conforme os indígenas, o mais grave de toda a situação é que não foi preciso aprovar nenhuma proposta legislativa anti-indígena, daquelas que tramitavam na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, caso da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215; medidas provisórias e decretos presidenciais são os instrumentos escolhidos pela nova gestão. “Não concordamos (também) com o presidente Jair Bolsonaro ao promover o preconceito e a violência contra os povos indígenas”, denunciam.
“A atual conjuntura e as medidas do governo Bolsonaro são um incentivo para o aumento da violência contra os povos indígenas, contra suas organizações e criminalizam as lideranças que lutam pela demarcação e proteção de seus territórios”, relata Eliane.
“não vão permitir que os direitos conquistados e reconhecidos na Constituição de 1988, sejam destruídos e jogados no lixo pelo atual presidente do Brasil”
O indígenas exigem, acima de tudo, a demarcação de todas as terras indígenas do Brasil. Foto: Cimi Tocantins
O indígenas exigem, acima de tudo, a demarcação de todas as terras indígenas do Brasil. Foto: Cimi Tocantins
 Ao término do encontro, os indígenas Xerente e Krahô divulgaram uma carta onde reafirmam que “não vão permitir que os direitos conquistados e reconhecidos na Constituição de 1988, nos Art. 231 e 232, sejam destruídos e jogados no lixo pelo atual presidente do Brasil”.
Ressaltaram que se manterão em alerta, organizando-se e mobilizando-se, nas regiões e junto ao movimento indígena do país. Se for preciso, destacam, até internacionalmente. Para os povos Gerente e Krahô, só com mobilizações os indígenas conseguirão combater o retrocesso no tocante a seus direitos e territórios. Exigem, acima de tudo, a demarcação de todas as terras indígenas do Brasil.
Confira a carta na íntegra:

Nós lideranças indígenas do povo Xerente e do povo Krahô, reunidos entre 24 a 27 de janeiro, na aldeia Traíra, para debater e criar estratégias na defesa e garantia de nossos direitos na Constituição Federal, reafirmamos que de forma alguma, vamos aceitar nenhum retrocesso em nossos direitos. 
Não permitiremos que este governo coloque a FUNAI nas mãos dos produtores rurais, sendo estes os maiores inimigos dos povos indígenas já declarados neste país. 
Pedimos que o Ministério Público Federal – MPF entrem com uma ação contra a MP 870/2019 que retira a FUNAI do Ministério da Justiça e a coloca no Ministério da Agricultura e no Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, e exigimos que a FUNAI retorne imediatamente para o Ministério da Justiça de forma integral.
Nós lideranças, não concordamos com o presidente Jair Bolsonaro em promover o preconceito e a violência contra os povos indígenas. Nós lideranças indígenas também pedimos ao Ministério Público Federal – MPF que entre com uma ação para revogar o decreto sobre a posse de arma de fogo, que modifica o Decreto 5.123/2004, que permite a posse de armas. Nós povos indígenas não somos a favor da violência e o povo brasileiro não está preparado para lidar com tantas armas. A função do presidente da república é promover a paz e oferecer a qualidade de vida para seu povo, e não incentivar ainda mais a violência.
Nós povos indígenas sempre cuidamos da Mãe Terra, cuidamos da natureza, cuidamos das águas, e a terra sempre foi e será o mais sagrado para os povos indígenas, por isso, não vamos aceitar nenhuma redução dos territórios indígenas e o que vamos exigir deste governo, é que ele cumpra o que está estabelecido na Constituição Federal de 1988 no art. 231 e no artigo 67 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias, que a União deve demarcar as terras indígenas em um prazo de cinco anos. Esta é uma das principais funções deste governo, demarcar e regularizar todas as terras indígenas que estão com os processos administrativos paralisados.
Nós lideranças indígenas reunidos neste encontro, manifestamos que não somos a favor da violência e não aceitamos os pronunciamentos do presidente da república, que são preconceituosos, são um insulto, promovem a violência, ameaçam os territórios e retiram os direitos dos povos indígenas. Vamos continuar respeitando as terras indígenas, a natureza, a água e vamos manter nossa firmeza, exigindo a continuidade da demarcação das terras indígenas no Brasil.
Vamos garantir todos os nossos direitos, que as lideranças indígenas que morreram, garantiram para nossos filhos, vamos continuar as lutas deles e não vamos recuar aos pronunciamentos e ações contra nós povos indígenas do presidente Jair Bolsonaro.
Chega de violência contra os povos indígenas do Brasil!
Demarcação Já!

Aldeia Traíra, 27 de janeiro de 2019.

24 de jan. de 2019

TERRAS INDÍGENAS

Pelo menos seis terras indígenas sofrem com invasões e ameaças de invasão no início de 2019
Invasão de madeireiros, loteamento dentro de terras demarcadas e ameaças de posseiros foram registrados em terras do Maranhão, Mato Grosso, Pará e Rondônia

Devido à falta de proteção da área, os invasores chegam a montar acampamentos dentro do território Karipuna para fazer a retirada ilegal de madeira. Foto: RogerioAssis/Greenpeace
POR TIAGO MIOTTO, DA ASCOM/CIMI
O ano de 2019 inicia com uma intensificação das denúncias de invasão a terras indígenas no Brasil. Ao menos cinco terras demarcadas registraram roubo de madeira, derrubada de floresta para pastagens e, ainda mais grave, a abertura de picadas e estabelecimento de lotes para ocupação ilegal dos territórios tradicionais.
As Terras Indígenas (TIs) Arara, no Pará, e Arariboia, no Maranhão, registraram no primeiro mês do ano a invasão de madeireiros e a de grileiros que vem tentando se estabelecer no interior das áreas demarcadas. Os povos Uru-Eu-Wau-Wau e Karipuna, ambos em Rondônia, identificaram novas investidas de grileiros, que já abrem picadas e, no caso Karipuna, vem se estabelecendo dentro da terra indígena.
A posse do governo de Jair Bolsonaro e a eleição de políticos conservadores alinhados com o agronegócio no nível local também gerou repercussão no entorno das TIs Marãiwatsédé, em Mato Grosso, e Awá, no Maranhão. Indígenas, o Ministério Público Federal (MPF) e a Fundação Nacional do Índio (Funai) denunciaram ameaças de reinvasão de posseiros a ambas as terras, articuladas por políticos e fazendeiros.
No caso da TI Awa, a Funai também notificou a invasão de madeireiros e fazendeiros, que tem derrubado as matas da terra indígena para a criação de gado, aproveitando-se da falta de recursos do órgão indigenista para fazer a fiscalização constante da área.
Em pelo menos quatro destas terras indígenas, a devastação causada por invasores e os riscos que eles representam são ainda mais graves em função da presença de grupos indígenas isolados. É o caso das TIs Awá, Arariboia e Uru-Eu-Wau-Wau, onde a existência destes grupos é reconhecida pela Funai, e da TI Karipuna, onde os indígenas já afirmaram terem avistado isolados circulando pelo território.
O observatório De Olho nos Ruralistas também incluiu, entre as investidas contra terras indígenas registradas no início de 2019, a invasão de garimpeiros à TI Yanomami, em Roraima. Além das invasões a terras demarcadas, um ataque a tiros contra os Guarani Mbya da retomada Ponta do Arado, em Porto Alegre (RS), marcou o mês de janeiro.
“Está em curso no Brasil uma nova fase de esbulho possessório contra terras indígenas, realizada por grupos econômicos de forma ilegal e criminosa. Eles são incentivados e acobertados pela política indigenista do governo Bolsonaro”.
       O aumento das invasões a terras demarcadas vem sendo verificado nos últimos anos, após os cortes nos recursos dos órgãos responsáveis por fiscalizar as terras indígenas e unidades de conservação, durante o governo Temer. Em 2017, o Cimi registrou 96 casos de invasão, exploração ilegal de recursos naturais e danos diversos às terras indígenas no Brasil – um aumento de 62% em relação ao ano anterior, quando 59 casos foram registrados.
Alguns dos casos registrados nas últimas semanas referem-se a terras indígenas cujos povos têm denunciado de forma recorrente as invasões e conflitos com madeireiros ou fazendeiros.
Lideranças desses territórios, porém, afirmam que as ameaças estão aumentando e que os invasores estão se sentindo “representados” por Jair Bolsonaro, que desde a campanha eleitoral vinha se pronunciando contra as demarcações e os direitos indígenas.
“Assim que o novo governo tomou posse lá em Brasília, as pessoas que sempre quiseram invadir as terras indígenas se sentiram representadas. No momento, a gente está praticamente desamparado”, avalia Puré Uru-Eu-Wau-Wau.
Na avaliação do secretário executivo do Cimi, Cleber Buzatto, as primeiras medidas do governo Bolsonaro serviram de incentivo a este tipo de ação. O desmembramento da Funai, a transferência das demarcações de terras indígenas ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, dominado por ruralistas, e o enfraquecimento do Ministério do Meio Ambiente foram determinados já no primeiro dia de expediente do novo governo, por meio da Medida Provisória (MP) 870.
“Está em curso no Brasil uma nova fase de esbulho possessório contra terras indígenas, realizada por grupos econômicos de forma ilegal e criminosa. Eles são incentivados e acobertados pela política indigenista do governo Bolsonaro. Os discursos contra os direitos constitucionais indígenas feitos desde a campanha, agora, se refletem em seus atos administrativos”, avalia Buzatto.
“No ano passado, o pessoal era mais medroso e tirava madeira de madrugada. Agora, com o novo governo, até cinco horas da tarde se vê caminhão saindo carregado”.
Após denúncias, Ibama e Polícia Federal realizaram ação de ficalização na TI Arara. Foto: Ibama
TI Arara: roubo de madeira e abertura de lotes
Na primeira semana do ano, teve grande repercussão a denúncia de roubo ilegal de madeira e abertura de picadas para o estabelecimento de lotes na TI Arara, feita pelos indígenas do povo Arara e confirmada pela própria Fundação Nacional do Índio (Funai). Temendo confronto, os indígenas exigiram ações de fiscalização e retirada dos invasores, pedido referendado pelo Ministério Público Federal (MPF).
Após sobrevoo, entretanto, agentes do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e da Polícia Federal (PF) afirmaram ter encontrado apenas “focos pontuais” de desmatamento, sem invasão e derrubadas “de grandes proporções”.
As afirmações são contestadas pelos indígenas, que vêm denunciando a presença constante de invasores na TI e a retirada de grandes volumes de madeira ilegal. Ano passado, lideranças denunciaram a situação à comitiva da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), mostrando fotos de uma expedição realizada por eles dentro do território em outubro.
“Encontramos muitas madeiras novas, recém cortadas. Muitas vezes os madeireiros ficam nos ameaçando, como se a terra fosse deles”, explicou à época Tabá Arara, cacique de uma das seis aldeias da TI Arara. Uma nova expedição, já em 2019, indicou o aumento das invasões e o surgimento de picadas para o estabelecimento de lotes.
Para José Cleanton Ribeiro, membro da equipe de Altamira do Cimi regional Norte 2, o Ibama e a PF não identificaram o desmatamento porque não é possível ver o corte raso e direcionado da madeira apenas por sobrevoos.
“Não aparecem mais as derrubadas, como acontecia antes. Eles levam serrarias portáteis e cortam apenas as árvores mais valiosas, sem abrir clareiras. Depois retiram a madeira já serrada, usando estradas que também ficam por baixo das copas das árvores”, explica.
Segundo o missionário, diariamente os indígenas identificam novas picadas, inclusive abaixo das placas de identificação da terra indígena, e os pontos mais sensíveis são nas proximidades da rodovia Transamazônica, que corta a TI Arara – onde o Ibama identificou estacas, marcando uma tentativa de ocupação ilegal.
“O cacique disse que, no ano passado, o pessoal ainda era mais medroso, tirava madeira de madrugada. Agora, com o novo governo, até cinco horas da tarde se vê caminhão saindo carregado”, afirma Ribeiro.
“Estamos muito preocupados, porque com esse presidente eleito eles estão se sentindo com mais força. Precisamos de fiscalização permanente”
Desde 2017, indígenas vem denunciando desmatamento e invasão de grileiros na TI Karipuna. Foto: Tommaso Protti/Greenpeace.
Em Rondônia, loteamento, invasões e ameaças
No estado de Rondônia, ao menos duas terras indígenas, dos povos Uru-Eu-Wau-Wau e Karipuna, registraram a presença de invasores no início de 2019. Ambas são terras em que os indígenas vêm denunciando a crescente pressão de grileiros, que buscam estabelecer lotes e ocupar ilegalmente o território.
No início de janeiro, vídeos gravados por indígenas do povo Uru-Eu-Wau-Wau repercutiram ao mostrar lideranças confrontando invasores que estavam abrindo lotes dentro de sua terra.
“Aqui no meio dos índios não pode”, informa a liderança aos invasores.
“A ordem veio de fora”, responde um deles. “Amanhã vem mais de 200 pessoas aqui, vocês fiquem esperando. Vem gente de todo canto”, ameaça.
 Após as denúncias, uma ação da Polícia Federal na terra indígena localizou as picadas abertas ilegalmente e prendeu um dos invasores. Na mesma semana, entretanto, os Uru-Eu-Wau-Wau encontraram indícios da presença de grileiros em outra região da terra indígena.
“Nessa primeira invasão, eles praticamente entraram na aldeia, ficaram a apenas dois quilômetros. Muito perto”, explica Puré Uru-Eu-Wau-Wau. “Depois da ação da polícia, eles estão se mudando para outros locais. Seguem loteando nossa terra”.
Em 2017 e em 2018, com a falta de fiscalização e ação do Estado, guerreiros do povo Uru-Eu-Wau já haviam expulsado grileiros de dentro da terra indígena, demarcada em 1991.
Próximo à aldeia 623, lideranças da TI Uru-Eu-Wau-Wau encontraram uma das placas identificação do território danificadas por tiros. Para os indígenas, é um recado dos invasores. Foto: povo Uru-Eu-Wau-Wau
Próximo à aldeia 623, lideranças da TI Uru-Eu-Wau-Wau encontraram uma das placas identificação do território danificadas por tiros. Para os indígenas, é um recado dos invasores. Foto: povo Uru-Eu-Wau-Wau
Os Karipuna, por sua vez, denunciam que a presença de invasores dentro de sua terra indígena se agravou sensivelmente no início de 2019. O Posto Indígena de Vigilância (PIV) da Funai dentro do seu território tem servido de base aos invasores, que avançam mais a cada dia.
No dia 20 de janeiro, indígenas encontraram cerca de 20 invasores a apenas oito quilômetros da aldeia Panorama. Na região conhecida como Piquiá, próximos à principal estrada que leva às casas dos Karipuna, os grileiros portavam foices, terçados e enxadas e chegaram a ameaçar os indígenas.
O MPF de Rondônia, em ofício no qual solicita medidas urgentes para coibir as invasões na TI Karipuna, afirma que o cenário “vem se agravando, podendo tornar-se insustentável”. O órgão, que também pede providências contra as invasões na TI Uru-Eu-Wau, avalia que a situação pode levar a “conflitos sangrentos” e causar “prejuízo às populações tradicionais vulneráveis”.
Desde 2017, os Karipuna vêm denunciando a invasão de madeireiros, garimpeiros, e a abertura e venda de lotes para ocupação ilegal dentro da terra indígena, que já perdeu 10 mil hectares de floresta. Por se tratar de um povo de contato recente e pouco numeroso, quase dizimado durante o século passado, o MPF de Rondônia caracterizou sua situação como de “eminente genocídio”. As lideranças também relatam estar sofrendo ameaças, em função das denúncias que têm feito aos órgãos de fiscalização e até em organismos internacionais, como a Organização das Nações Unidas (ONU).
“Estamos muito preocupados, porque com esse presidente eleito eles estão se sentindo com mais força. Precisamos ter fiscalização permanente para que resolva todo esse problema no território”, afirma o cacique André Karipuna.
“Aumentaram as ameaças de que as terras serão invadidas. Por enquanto a reocupação foi frustrada, mas existe uma ameaça jurídica, de revisar a demarcação e a desintrusão no Ministério da Agricultura”
Desmatamento registrado na TI Awa em 2014, ano em que a Funai retirou os ocupantes ilegais da área. Foto: Mário Vilela/Funai
TI Awa: ameaças e invasão estabelecida
Nas primeiras semanas de 2019, também repercutiu na imprensa uma ameaça de invasão à TI Awa, localizada no Maranhão. Indígenas e integrantes da Frente de Proteção Etnoambiental da Funai denunciaram as ameaças de invasão por parte de posseiros expulsos da terra indígena durante a sua desintrusão, em 2014.
O convite para uma reunião voltada às pessoas “atingidas pela Funai” circulou nas redes sociais. Servidores do órgão reportaram que em São João do Caru, um dos municípios próximos à TI Awa, um carro de som convocava os antigos ocupantes não indígenas da área a retornarem para dentro dela.
Após as denúncias, o MPF no Maranhão solicitou à Justiça Federal medidas urgentes para garantir a segurança no entorno da TI Awa e evitar sua possível invasão. De acordo com o órgão, o movimento de reocupação foi fomentado por “fazendeiros e madeireiros” após a publicação da Medida Provisória (MP) 870.
Os posseiros retirados durante a desintrusão da TI Awa, em 2014, foram identificados pela Justiça como ocupantes de má-fé, pois haviam ocupado a terra após o início do processo de demarcação.
“Os políticos e fazendeiros costumam usar os posseiros, pessoas humildes, como massa de manobra para impedir a demarcação”, relembra Bruno de Lima, coordenador de Frente de Proteção Etnoambiental da TI Awa. Apesar da mais recente ameaça ter sido frustrada pelas denúncias, a invasão constante da TI Awa por madeireiros e fazendeiros já é um fato consumado desde 2016, quando a Funai deixou de ter recursos para manter o policiamento permanente da terra indígena.
Operação realizada na TI Awa. Foto: Mario Vilela/Funai
“Quando a gente perdeu o policiamento, começaram a entrar de novo as invasões de gado, madeireiras. Eles têm transformado a terra num grande pasto. Sem polícia permanente, fazendo só ações esporádicas, a gente não consegue combater as invasões”, explica Lima.
Em janeiro de 2018, após uma ação de fiscalização e expulsão de invasores realizada pelos povos Awá Guajá, Guajajara e Ka’apor, fazendeiros queimaram uma das duas bases da Funai na TI Awa.
 Segundo Lima, a Funai está buscando junto ao governo do Maranhão um acordo para que o estado garanta o policiamento permanente da área. O órgão já possui um convênio com o estado, mas não tem condições pagar as diárias para os policiais, cuja presença se torna cada vez mais urgente.
“Desde a eleição do novo presidente, aumentaram as ameaças de que as terras serão invadidas. Por enquanto a reocupação foi frustrada, mas existe uma ameaça jurídica, onde eles vão tentar revisar a demarcação e a desintrusão junto ao ministério da Agricultura”, afirma Bruno de Lima.
“Não queremos mais pressão para a reinvasão. Queremos dar fim à luta pela terra. Se houver a reinvasão, nós estamos preparados para a guerra”
Terra Indígena Marãiwatsédé, onde o deputado federal eleito Nelson Barbudo (PSL-MT) estaria organizando uma nova invasão. Foto: Arquivo Cimi
Marãiwatsédé: ameaça de reinvasão
Em Mato Grosso, as ameaças de reinvasão à TI Marãiwatsédé fizeram com que o MPF se manifestasse em defesa do direito originário do povo Xavante à sua terra, homologada em 1998. O órgão afirmou que qualquer ataque ou tentativa de invasão à terra indígena “receberá resposta enérgica e eficaz”, com a responsabilização civil e criminal de todos os envolvidos.
A manifestação do MPF veio depois da Funai denunciar que o deputado federal eleito Nelson Barbudo (PSL-MT) estaria organizando uma nova invasão à TI Marãiwatsédé, para “devolvê-la” aos posseiros e fazendeiros expulsos da terra indígena durante o processo de desintrusão, em 2012, após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).
Segundo Vanderlei Temireté Xavante, vereador no município de Bom Jesus do Araguaia e filho de um dos caciques da TI Marãiwatsédé, tem havido comentários sobre a possibilidade de nova invasão nas cidades próximas à terra indígena.
Ao lado da prefeita de São Félix do Araguaia, Janailza Taveira, o deputado eleito Nelson Barbudo (PSL-MT) afirma que vai lutar para rever a demarcação da TI Marãiwatsédé. Foto: Reprodução
“Políticos estão tentando organizar para a reinvasão. Isso é ameaça. Tem posseiros que não querem voltar, porque receberam indenização, mas os grandes querem invadir de novo. Dizem que o presidente Bolsonaro vai devolver para eles a terra”, afirma Vanderlei.
Além de Barbudo, ele cita o senador José Medeiros (Pode-MT) como um dos articuladores da nova ameaça. Em vídeo gravado em suas redes sociais, o senador afirmou que pediu ao Secretário de Assuntos Fundiários do governo Bolsonaro, o ruralista Nabhan Garcia, a revisão da demarcação e desintrusão da TI Marãiwatsédé.
“Nós estamos aguardando o resultado final disso, porque nós temos a origem e a história dos nossos ancestrais. Em 1966, fomos expulsos da nossa terra, ficamos sem aldeia e sem casa. As novas gerações voltaram, e nós estamos aqui”, afirma Vanderlei.
Em carta do dia 16 de janeiro, os caciques das seis aldeias que compõem a TI Marãiwatsédé afirmam: “Não queremos mais pressão para a reinvasão, com os políticos e autoridades da região do Vale do Araguaia. Queremos dar fim à luta pela terra. Se houver a reinvasão, nós estamos preparados para a guerra”.







23 de jan. de 2019

MOBILIZAÇÃO INDÍGENA

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