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31 de ago. de 2016

CPI DA FUNAI

Inserido por: Administrador em 26/08/2016.
Fonte da notícia: Assessoria de Comunicação - Cimi



Parlamentares ruralistas protocolaram um requerimento na Mesa Diretora da Câmara Federal solicitando a criação de uma nova Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para “investigar fatos relativos” à Fundação Nacional do Índio (Funai) e ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). A iniciativa era esperada pelo movimento indígena e entidades indigenistas. 

No requerimento, os ruralistas apontam fraudes na demarcação de 20 terras indígenas nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Bahia e Pará. No entanto, não apresentam sequer um fato determinado ou prova para tais fraudes - se restringiu a matérias jornalísticas do Canal Rural, imprensa associada e artigos de indivíduos que coadunam com as teses da CPI. 


São 52.268 indígenas, em números aproximados, diretamente na mira deste pedido de nova CPI, que compõem os povos Parakanã (PA), Kaingang, Guarani (Mbyá, Ñandeva, Kaiowá e Xeripá) - RS e MS -, Terena (MS), Xavante (MT), Pataxó (BA) e Tupinambá (BA). Os ruralistas pretendem acabar com 1.207.122 hectares em alguma fase do procedimento de demarcação - identificação, declaração, homologação e registro. 


A primeira versão da CPI da Funai e do Incra teve o tempo regimental encerrado no último dia 18 sem ao menos um relatório apresentado sobre o trabalho transcorrido durante oito meses, com três prorrogações aprovadas pela Mesa Diretora da Câmara Federal: duas com o então presidente Eduardo Cunha (PMDB/RJ) e uma pelo novo presidente, Rodrigo Maia (DEM/RJ). Todas as decisões foram monocráticas. 


Então presidida pelo ruralista Alceu Moreira (PMDB/RS), o mesmo que em 2013 incitou pequenos produtores a atos de violência contra indígenas, a CPI da Funai e do Incra esbarrou no Supremo Tribunal Federal (STF): o presidente da Corte Suprema, ministro Ricardo Lewandowski, não autorizou a quebra de sigilo fiscal de entidades que apoiam a causa indígena por entender que o ato fugia dos objetivos da CPI. 


"A CPI da Funai/Incra não ofereceu qualquer tipo de benefício à sociedade brasileira, mas serviu perfeitamente aos interesses dos ruralistas. Estes aproveitaram-se dos recursos públicos para visitar suas bases eleitorais, para amplificar o discurso do ódio e da violência contra os povos por meio de veículos de comunicação comerciais e estatais, obtendo visibilidade e promoção política e econômica a si próprios, a seus partidos, às corporações empresariais que os financiam e a seus candidatos a prefeito e vereadores na presente corrida eleitoral”, diz trecho de nota pública divulgada pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi). 


No lugar de fatos determinados, teses



Em um juntado de notícias veiculadas pela imprensa sobre o desmantelamento do órgão indigenista estatal, os ruralistas buscam induzir duas teses como fatos determinados: a Funai foi desestruturada, e assim o trabalho do órgão incorre em erros; por outro lado, quando as organizações indigenistas buscam criticar a desestruturação do órgão, desejam na verdade influenciar num sentido fraudulento as demarcações.
 

Se hoje os ruralistas atacam a senadora Gleisi Hoffman (PT/PR) na disputa envolvendo o golpe contra Dilma Rousseff, no requerimento a citam enquanto ministra da Casa Civil na ocasião em que Gleisi pediu ao Ministério da Justiça que suspendesse as demarcações em seu reduto político, o Paraná, com base em slides da Embrapa, onde se questionava inclusive se os Guarani eram brasileiros. 


O requerimento segue tratando como fato determinado para a posse da nova CPI desentendimentos entre o próprio governo. Um deles envolve a Terra Indígena Barra Velha/Monte Pascual, do povo Pataxó. Os ruralistas citam a oposição do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) à permanência dos Pataxó no território alegando que no local funciona um Parque Nacional de proteção ambiental.


Já no caso da Terra Indígena Apyterewa, no Pará, do povo Parakanã, os ruralistas citam a morosidade do Incra em reassentar 412 famílias de pequenos agricultores que vivem dentro dos domínios Parakanã. As famílias estão em processo de reassentamento numa fazenda de 26 mil hectares, nas cercanias da terra indígena, confiscada pela Justiça Federal de Goiás por ter sido comprada com dinheiro do tráfico de drogas.  


"Com a nova CPI, os ruralistas pretendem continuar queimando dinheiro público em tentativas requentadas e bizarras de criminalização de lideranças indígenas e de organizações da sociedade civil que apoiam a luta dos povos em defesa e pela implementação de seus direitos no Brasil”, pontua outro trecho da nota do Cimi.


Criar o problema e vender a solução
 


Um caso emblemático é citado como ‘fato determinado’ pelo requerimento da nova CPI: a Terra Indígena Marãiwatsédé, do povo Xavante, no Mato Grosso. Foram mais de 20 anos para a homologação da terra ser assinada Pela presidência da República. Depois disso, uma verdadeira operação de guerra foi articulada pelo governo federal para desintrusar posseiros e grileiros, que ano após ano foram trazidos de todo canto do país para ocupar pequenas porções do território. 


O relator da finada CPI da Funai e do Incra, o deputado ruralista Nilson Leitão (PSDB/MT), e um dos mentores do requerimento da nova CPI, é investigado pelo Ministério Público Federal (MPF) de ser o suporte para recentes invasões à Marãiwatsédé. em escutas telefônicas realizadas pela Polícia Federal, Leitão pede “30 escrituras para ele”, registradas irregularmente por posseiros em cartórios da região. 


Um dos líderes dos fazendeiros envolvidos preso pela PF, Sebastião Prado, afirmou nas mesmas escutas que seu contato em Brasília era Leitão, por sua vez amigo de juízes capazes de reverter decisões a favor dos posseiros, grileiros e fazendeiros. O trabalho da PF ocorreu depois que agentes foram mandados de volta à Marãiwatsédé para investigar invasões que vinham ocorrendo desde a desintrusão, concluída em 2013. 


No requerimento, os ruralistas citam Marãiwatsédé alegando que os conflitos entre indígenas e ‘produtores rurais’ segue mesmo após o Executivo homologar a terra. Ou seja, o próprio relator da CPI encerrada é acusado no STF, acumulando o oitavo processo na Corte Suprema, por gerar os conflitos na terra Xavante. O documento, por sinal, é costurado por situações variáveis, mas com essa mesma ordem. 


Condicionantes de Raposa Serra do Sol e Marco Temporal



Outra manipulação flagrante do relatório envolve as 19 condicionantes à homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Em 2013, o STF as votou. Todas foram aprovadas pelos ministros, mas com uma determinação objetiva: nenhuma delas se vinculam às demais terras indígenas do país. Todavia, os ruralistas as usam como fatos determinados como desrespeitos observados no procedimento demarcatório das terras citadas.  


O Marco Temporal, incluído nas condicionantes, é transmutado pelo requerimento nas revisões de demarcações - chamadas no documento de ampliações. Além de também restrita à Raposa Serra do Sol, terras indígenas demarcadas antes de 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, podem ser revistas para reparar erros anteriores inerentes aos momentos políticos, sobretudo o regime militar (1964-1985).


Citam ainda reportagens envolvendo a venda de certidões indígenas, sem nenhuma relação com as demandas territoriais, e o recebimento em milhões de recursos públicos por parte de ONG’s, caso da Missão Evangélica Caioá, que em nada tem a ver com a demarcação de terras indígenas ou em ativismo político em defesa dela. Nesse sentido, o MPF acompanha e aciona judicialmente os envolvidos em ilícitos, como o próprio requerimento pontua.

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