30 de set. de 2020

MEIO AMBIENTE

 

GOVERNO BOLSONARO: RETROCESSOS E TRAGÉDIA AMBIENTAL


Brigadistas Indígenas aplicando o MIF na Terra Apinajé. (foto: Antonio Veríssimo. Junho de 2018)

Esse ano, atrasos na contratação de Brigadistas Indígenas do IBAMA/Prev-Fogo impediu e dificultou a aplicação do Manejo Integrado do Fogo-MIF, na terra indígena Apinajé, previsto para os meses de maio e junho. Aqui em Tocantins os meses de agosto e setembro é considerado período crítico de alto risco de incêndios florestais, porque a matéria combustão está seca, é tempo de ventos fortes e umidade do ar baixa - o que potencializa o risco de alastramento de incêndios florestais. É importante destacar que sem a aplicação do Manejo Integrado do Fogo-MIF nos meses de maio e junho é quase impossível controlar ou apagar um incêndio de grandes proporções nesse período de estiagem e seca severa.

O Manejo Integrado do Fogo-MIF é a pratica de usar o fogo de baixa intensidade pra fazer aceiros em determinadas áreas para evitar e impedir que incêndios que ocorrem em agosto e setembro se alastrem e destrua matas ciliares, nascentes, casas, roças, áreas de coleta e de reprodução animal. Neste ano de 2020 em razão desses atrasos do governo, em algumas comunidades Apinajé, lideranças indígenas voluntárias fizeram a aplicação do Manejo Integrado do Fogo-MIF por conta própria, pra prevenir e evitar danos e tragédias que podem ocorrer nesse período crítico de estiagem.

Nesse período de estiagem os 19 Brigadistas indígenas do Prev-Fogo/IBAMA estão orientando as comunidades sobre a necessidade de acerar as roças e adoção de (outras) medidas preventivas no momento de queimar os roçados. Ainda estão fazendo acompanhamento e queima controlada de roças tradicionais nas aldeias indígenas, pra evitar que o fogo saia do controle e atinja as propriedades vizinhas limítrofes à essa terra indígena.

Mas, o MIF não foi aplicado em toda extensão do território Apinajé, e nesse início de setembro ao menos 69 focos incêndios surgiram e se alastraram no interior da terra indígena avançando sobre as matas ciliares ameaçando nascentes e mananciais de águas. Felizmente a atuação firme desses Brigadistas Indígenas e as (poucas) chuvas que tem caído nesse final de setembro ajudaram diminuir os focos de incêndios neste território indígena.

Mata ciliar e nascentes de águas ameaçados pelos incêndios florestais. (foto: Antonio Veríssimo. setembro de 2020) 

Rastros de cavalos teriam sido vistos pelos Brigadistas na área aonde começou o fogo, provavelmente foram caçadores os responsáveis por esse crime ambiental. O fato é que em meio à pandemia os invasores e malfeitores estão aproveitando pra invadir o território Apinajé pra caçar, pescar e explorar madeiras. Nesse período entre junho e setembro já foram registrados alguns incidentes graves envolvendo caçadores (invasores não-índios) e indígenas nessa mesma área aonde aconteceu esses incêndios.

Em 2019 o governo de Jair Bolsonaro já havia reduzido a quantidade de Brigadistas e as viaturas do IBAMA/Prev-Fogo na Terra Indígena Apinajé. Nesse governo também estão acontecendo o sistemático desmonte e sucateamento da estrutural do IBAMA/ICMBio, da Fundação Nacional do Índio-FUNAI, o que tem dificultado as Ações de Monitoramento Ambiental, Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais nas Terras Indígenas localizadas nos Biomas Amazônia, Pantanal e Cerrado.

É possível que esse desmonte e sucateamento dos órgãos responsáveis pela Fiscalização e Monitoramento Ambiental neste governo, esteja acontecendo de forma propositada e planejada pra dificultar e atrapalhar a fiscalização, prevenção, controle e combate aos desmatamentos, queimadas e outros crimes ambientais. A falta de planejamento e poucos investimentos na fiscalização, monitoramento e prevenção de ilícitos ambientais comprova o caráter perverso dessa política de retrocessos ambiental.  

O comportamento a atitudes do Presidente deixam claro que a má gestão e descaso com o meio ambiente é um projeto (intencional) de governo. Logo que tomou posse o Bolsonaro e o Ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles trataram logo de inventar uma intriga com países financiadores do Fundo Amazônia, o que levou Alemanha e Noruega suspenderem o Acordo firmado com o Brasil e consequentemente bloquearam os recursos que vinha sendo repassados ao governo brasileiro. Todos sabemos que os recursos do Fundo Amazônia eram absolutamente necessários para o combate ao desmatamento e prevenção às queimadas, e estavam sendo utilizados para contratação de Brigadistas e aquisição de equipamentos de prevenção e combate aos incêndios florestais, e outras demandas na área ambiental.

A decadência ambiental promovida pelo governo acontece ainda na forma de enfraquecimento dos órgãos e instituições de fiscalização e controle. A redução da participação da Sociedade Civil e indicação de pessoas ligadas à interesses empresariais e governamentais para o Conselho Nacional de Meio Ambiente-CONAMA é a prova disso. A exoneração de Ricardo Galvão Diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais-INPE, por motivos de divulgação de dados e informações verdadeiras sobre o aumento do desmatamento da Amazônia foi outro absurdo que evidencia o plano governamental de “passar a boiada” por cima de tudo e de todos.

Nesses 1 ano e 9 meses de retrocessos, assistimos o governo atacar as ONGs, censurar e intimidar a Imprensa, acusar e culpar os indígenas e confrontar adversários. Mas, não vimos nenhuma atitude do governo pra prevenir os incêndios florestais, combater o desmatamento e proteger as de terras indígenas. Diante dessa omissão do governo, desde 2019 observamos o agravamento de conflitos agrários e aumento desses grandes incêndios florestais que estão se expandindo e destruindo os principais Biomas brasileiros. Em tempos de pandemia a fumaça, a fuligem das queimadas agravaram ainda mais as complicações causadas pelo vírus na saúde das pessoas infectadas, e podem ter contribuído para o elevado número óbitos de indígenas por COVID-19 no País.

A controversa proposta de liberação de garimpo (mineração) em terras indígenas é perigosa e inaceitável, por ser potencialmente poluidora e degradante para o meio ambiente.  Mesmo assim em várias ocasiões o General Hamilton Mourão vice-Presidente da República tem se manifestado favorável a liberação de garimpos em terras indígenas. A prática garimpeira (seja em terras indígenas ou não) provoca a degradação das margens dos rios, derrubada de árvores pela raiz e lançamento (descarte) de toneladas de mercúrio, óleo diesel e outros resíduos químicos no solo, no ar e nas águas. Além de causar danos à fauna e flora nas regiões aonde acontece, a atividade garimpeira também divide as comunidades; provocando desavenças e conflitos internos. Infelizmente essa é a proposta desse governo pra “desenvolver” e “melhorar” a Vida dos Povos Indígenas da Amazônia?!

Mas, em resposta esse governo trata de criminalizar e ameaçar as Organizações indígenas e indigenistas, recentemente a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil-APIB - Organização legítima e reconhecida internacionalmente que representa os povos indígenas do Brasil, foi alvo de ataques e intimidações. Outra atitude irresponsável dos membros desse governo tem sido a recorrente prática de racismo, calunia e difamação contra as lideranças indígenas tradicionais que tem uma história de lutas em defesa do meio ambiente, por demarcação, regularização e garantia de territórios. As acusações infames contra indígenas não param por aí, no dia 22/09, terça-feira no discurso de abertura da 75ª Assembleia Geral da ONU o Presidente Bolsonaro de forma irresponsável e mentirosa culpou índios e caboclos pelas queimadas que estão acontecendo na Amazônia, Pantanal e Cerrado.   

Denunciamos que essa verbalização agressiva do Presidente pode até estimular atos criminosos por parte de seus simpatizantes e apoiadores contra indígenas. E que muitas violações de direitos humanos estão acontecendo no bojo desse governo, e parece que as autoridades estão anestesiadas. Mesmo assim cabe a Polícia, o MPF, o STF e Congresso Nacional o papel de investigar e apurar responsabilidades e possíveis negligências, falhas, prevaricações e omissões do Chefe do Poder Executivo Federal, e o descumprimento das obrigações constitucionais de proteger as terras indígenas, e essa política da irresponsabilidade, abandono e retrocesso ambiental em curso.


Terra indígena Apinajé, 30 de setembro de 2020


Associação União das Aldeias Apinajé-Pempxà

9 de set. de 2020

AÇÕES CONTRA COVID-19

 

MANIFESTO DA ASSOCIAÇÃO PEMPXÀ CONTRA REABERTURA DAS AULAS PRESENCIAIS NA UFT

 

Ao Sua Excelência o Sr

Luís Eduardo Bovolato

Reitor da Universidade Federal do Tocantins

Campus de Tocantinópolis-TO

 

Senhor Reitor;

 

Cumprimento o cordialmente em nome do povo Apinajé, diante da atual crise de COVID-19 que está ameaçando e infectando milhares de indígenas no país e no Tocantins, viemos manifestar nossa preocupação e contrariedade com a proposta de reabertura das aulas presenciais na Universidade Federal de Tocantins, Campus de Tocantinópolis. 

 

Considerando que no momento no Estado de Tocantins, encontram se muitos pessoas não-índios infectados resultando em muitos óbitos nas cidades de Palmas, Araguaína, Gurupi e outras. Que atualmente a quantidade de infecções não param crescer também nas cidades do entorno e vizinhas da Terra Apinajé. Que no final de agosto, (28/08) tivemos o 1º caso de um (a) estudante indígena de Universidade particular que foi infectada na cidade de Araguaína.

 

Ainda, que a maioria das terras indígenas do Estado de Tocantins a situação das infecções e mortes por COVID-19 ainda é crítica e não estão sob controle. Que diante dessa situação de pandemia estamos em alertas, seguindo as orientações e protocolos das autoridades sanitárias, realizando ações preventivas nas Barreiras Sanitárias implantadas e mantidas nas principais estradas de acesso às aldeias São José e Mariazinha, e também fazendo esclarecimentos sobre os risco e perigos dessa doença pra nossas famílias; especialmente os anciãos e crianças. Com essas medidas preventivas que realizamos até agora, só podemos recuar e afrouxar nossas ações quando diminuir essa crise e riscos pra nosso povo.

 

O Boletim Epidemiológico do MS/SESAI/DSEI-TO de 08/09/2020 informa que nas terras indígenas do Tocantins existem 45 suspeitos, 766 casos confirmados, 419 foram descartados, 349 casos estão ativos, 407 indígenas se recuperaram e ocorreram 08 óbitos. Portanto o atual quadro inspira cuidados e ainda não oferece segurança pra pessoas (indígenas) se reunirem mesmo com uso de máscaras e outros cuidados.

 

Portanto em razão dessa situação, nossos Estudantes indígenas do Curso de Educação do Campo não concordamos com reabertura das aulas presenciais proposto pela Universidade Federal de Tocantins-UFT, Campus de Tocantinópolis nesse momento em razão do risco de infecção de estudantes. Entendemos que nesse momento mais crítico precisamos continuar nos resguardando pra evitar que o COVID-19 venha infectar também nosso povo dentro das aldeias. Informamos que, só concordamos em voltar às aulas presenciais com segurança, sem ameaças e riscos de infecções, em razão da situação de exposição e aglomeração de pessoas em sala de aula.

 

Estamos à disposição para esclarecimentos e informações adicionais. Esperamos ser compreendidos e atendidos em nossas ponderações.


Terra indígena Apinajé, 09/09/2020


Associação União das Aldeias Apinajé-Pempxà

13 de jul. de 2020

NOTA DO CIMI

Nota pública sobre os vetos do presidente às medidas emergenciais de apoio aos povos indígenas na pandemia

Os vetos presidenciais ao PL 1142 reafirmam o preconceito, o ódio e a violência do atual governo em relação aos povos indígenas, quilombolas e populações tradicionais

Conselho Indigenista Missionário - Cimi

O Conselho Indigenista Missionário vem a público repudiar os vetos presidenciais ao Projeto de Lei (PL) nº 1142/2020, aprovado na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, que dispõe sobre medidas urgentíssimas de apoio aos povos indígenas em razão da pandemia do novo coronavírus, de autoria da deputada Rosa Neide (PT/MT).

Os vetos presidenciais reafirmam o preconceito, o ódio e a violência do atual governo em relação aos povos indígenas, quilombolas e populações tradicionais, negando mais uma vez o que preconiza a Carta Magna do Brasil em seus princípios fundamentais, artigo 3º, inciso IV: promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, de raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

O PL aprovado teve dezesseis importantes artigos vetados pelo presidente Bolsonaro, sendo, com isso, o projeto de lei mais vetado em toda história do país. Os vetos são alarmantes, sobretudo em tempos de pandemia, pois negam direitos e garantias fundamentais à vida dos povos tradicionais, como por exemplo o acesso a água potável, bem universal da humanidade. Além do acesso à água, foram vetados artigos fundamentais que garantiriam à população indígena o acesso a leitos de UTI, produtos de higiene, distribuição de alimentos, entre outros.

A justificativa do presidente para tais vetos baseia-se exclusivamente na falta de orçamento, o que é desmentido pela recente aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 10/2020 pelo Congresso Nacional. Conhecida como “Orçamento de Guerra”, a Emenda autoriza os gastos necessários para combater a crise gerada pela pandemia do novo coronavírus.

O presidente também desrespeita o Congresso Nacional ao vetar uma lei já aprovada quase por unanimidade, inclusive por partidos de sua base de sustentação. Essa postura presidencial demonstra total insensibilidade à situação de vulnerabilidade de milhares de famílias indígenas, quilombolas e das comunidades tradicionais em todo o território nacional, nesta grave crise condenadas à morte.

O Conselho Indigenista Missionário reitera seu apoio incondicional aos povos indígenas e populações tradicionais do Brasil e seu direito à vida e “vida em abundância” (Jo. 10,10).

Brasília, 08 de julho de 2020

Conselho Indigenista Missionário

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6 de fev. de 2020

APIB: NOTA DE REPÚDIO



Apib repudia projeto do governo Bolsonaro que libera mineração, hidrelétricas e agronegócio nas terras indígenas

Projeto de Lei 191/2020 foi protocolado na Câmara dos Deputados pelo Executivo nesta quinta-feira (6)
Acampamento Terra Livre 2019. Foto: Foto: Christian Braga/MNI
Fotos: Christian Braga/MNI
POR ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO DO CIMI
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) divulgou hoje (6) uma nota de repúdio contra o projeto de lei do governo Bolsonaro que pretende regulamentar atividades de exploração econômica de terras indígenas. Entre as atividades liberadas pelo projeto estão a mineração, o garimpo, a extração de petróleo e gás, a construção de hidrelétricas e a agropecuária, atendendo aos interesses de grandes empresários e fazendeiros.
A proposição do Executivo foi enviada nesta quinta-feira à Câmara dos Deputados, onde foi designada como Projeto de Lei (PL) 191/2020. O presidente Jair Bolsonaro se referiu à proposta como um “sonho”. Para a Apib, o projeto busca “na verdade autorizar também a invasão dos territórios indígenas”.
“O ‘sonho’ do governo Bolsonaro é na verdade a vontade de atender os interesses econômicos que impulsionaram a sua candidatura e sustentam o seu governo, mesmo que isso implique em total desrespeito à legislação nacional e internacional que assegura os nossos direitos fundamentais”, afirma a Apib.
Leia a íntegra da nota:

ARTICULAÇÃO DOS POVOS INDÍGENAS DO BRASIL
APOINME – ARPIN SUDESTE – ARPINSUL – Comissão Guarani Yvyrupa – Conselho do Povo Terena – ATY GUASU – COIAB


NOTA PÚBLICA DE REPÚDIO CONTRA O PROJETO DO GOVERNO BOLSONARO DE REGULAMENTAR A MINERAÇÃO, EMPREENDIMENTOS ENERGÉTICOS E O AGRONEGÓCIO NAS TERRAS INDÍGENAS
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) vem de público manifestar o seu veemente repúdio às manifestações de ódio e racismo visceral que o governo Bolsonaro desde o seu primeiro dia de governo tem manifestado rotineira e publicamente contra os povos, organizações e lideranças indígenas do Brasil, nos últimos dias materializadas no anuncio de um Projeto de Lei que visa definir “condições específicas para a pesquisa e lavra de recursos minerais, inclusive a lavra garimpeira e petróleo e gás, e geração de energia hidrelétrica em terras indígenas”, anúncio maquilhado de falsas boas intenções e retóricas que induzem à cooptação e divisão dos povos, tergiversando o real sentido da autonomia, para na verdade autorizar também a invasão dos territórios indígenas por meio de outros empreendimentos tais como a agricultura extensiva, a pecuária e outros empreendimentos predatórios.
A vil afirmação de que “O índio é um ser humano exatamente igual a nós. Tem coração, tem sentimento, tem alma, tem desejo, tem necessidades…” repete o etnocentrismo dos invasores europeus, que há mais de 500 anos massacraram milhões de irmãos nossos, prática que nos tempos atuais configura crime racial inafiançável.
O “sonho” do governo Bolsonaro é na verdade a vontade de atender os interesses econômicos que impulsionaram a sua candidatura e sustentam o seu governo, mesmo que isso implique em total desrespeito à legislação nacional e internacional que assegura os nossos direitos fundamentais, o nosso direito originário, direito congénito, de ocupação tradicional das nossas terras e territórios, o nosso direito de posse e usufruto exclusivo, e o nosso direito à consulta, ao consentimento livre, prévio e informado sobre quaisquer medidas administrativas e legislativas que nos afetem.
É preciso que se diga, a maioria dos povos e comunidades indígenas do Brasil não comunga com os anseios de uma minoria de indivíduos indígenas que se iludem e dobram às camufladas más intenções deste governo.
A APIB, portanto, denuncia a manipulação que o Governo Bolsonaro faz do nosso direito à autonomia e repudia esse projeto de morte que a qualquer custo quer implantar nos territórios indígenas, com impactos irreversíveis particularmente sobre povos indígenas isolados e de recente contato, e chama a toda a sua base e movimentos, organizações e segmentos solidários da sociedade nacional e internacional a se somarem conosco nesta batalha pela vida e o bem viver não apenas dos povos indígenas mas de toda a humanidade e o planeta.
Brasília – DF, 06 de fevereiro de 2020
Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB

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3 de fev. de 2020

CULTURA INDÍGENA


GRATIDÃO AOS POVOS INDÍGENAS
(Porque os brasileiros devem)

*Fernando Schiavini

O que os brasileiros conhecem das contribuições dos indígenas à formação do Brasil e dos brasileiros, além das inevitáveis histórias da “bisavó pega a laço”?  Porque a história e a mídia enaltecem a participação dos europeus e dos negros na formação da cultura brasileira e os indígenas continuam discriminados, como se em nada houvessem contribuído com ela?

A PENETRAÇÃO NO TERRITÓRIO

O que a maioria dos brasileiros não sabe é que a própria penetração e colonização do território que viria a ser o BRASIL não teria sido possível sem a participação dos indígenas, de seus conhecimentos e tecnologias. Seria impossível aos portugueses, por exemplo, transportar alimentos da Europa, suficientes para suprir centenas de homens, em expedições ao interior que podiam durar vários anos.  Quando os europeus aqui chegaram, os indígenas brasileiros já haviam domesticado e cultivavam espécies alimentares há mais de 10.000 anos. No caso da mandioca, uma espécie reconhecida pela ciência como 100% brasileira, não apenas a cultivavam, mas haviam desenvolvido toda a tecnologia para o seu aproveitamento e conservação por longos períodos. A farinha de mandioca era o principal alimento das expedições, complementado com os produtos da caça, da pesca e da coleta de frutos, que também dependiam das tecnologias e dos conhecimentos indígenas para serem praticadas. A farinha de mandioca, aliás, foi o principal alimento dos brasileiros até finais do século XIX e até hoje está presente nos lares de todo o país.

O LEGADO NA ALIMENTAÇÃO

Com relação à alimentação, no entanto, não foi somente a mandioca. Os indígenas já haviam domesticado e disseminado, por todo o território nacional, o milho (hoje produzido e exportado em larga escala e do qual se origina uma série de produtos industriais), batata-doce, abóbora, inhame, cará, feijão, fava e banana, enumerando os mais conhecidos. De modo geral, os agricultores indígenas selecionavam suas sementes segundo algumas características positivas, como maciez, cores e tamanhos. Assim, nos legaram inúmeras variedades dessas espécies, que resultam não somente em excelentes qualidades alimentares, mas também em peso e produtividade. Abóboras gigantes que chegam a pesar 50 kg ou mais, “cabeças” de inhames que alcançam o peso de 20 kg, pés de mandioca que chegam a fornecer 50 kg de alimento, são muito comuns no Brasil.


Esses produtos são cultivados e alcançam boa produção em todos os quadrantes do território nacional, sem necessidade de insumos ou defensivos agrícolas, exatamente porque foram disseminados e adaptados pelos povos indígenas, em milênios de migrações e trocas intertribais.   Muitos desses alimentos, ainda largamente consumidos pelos brasileiros, também contribuíram para a implantação das fazendas de criação de animais. Desde o período colonial, é muito comum nas fazendas brasileiras a utilização do milho, da mandioca, dos inhames e das abóboras como ração para bois, galinhas, cavalos e porcos. Também foram com os indígenas que aprendemos a consumir inúmeros frutos nativos, como o caju, goiaba, abacaxi, maracujá, buriti, pequi, pitanga, apenas par citar alguns.

O CONHECIMENTO DAS ERVAS MEDICINAIS

A contribuição dos indígenas para a manutenção física dos brasileiros não para por aí. Os conhecimentos das ervas medicinais de todos os biomas do território nacional salvaram da morte milhões de pessoas, desde a colônia, acometidas por doenças tropicais. Ainda hoje essas ervas são largamente utilizadas em todo o país, principalmente no interior, onde continua muito comum se recorrer aos conhecimentos dos raizeiros, benzedeiras e pajés.  Mesmo nas grandes cidades do país ainda se encontram bancas de raizeiros oferecendo folhas, cascas e raízes para a cura de doenças. Inúmeras dessas ervas foram transformadas em remédios alopáticos e homeopáticos que são comercializados pelas farmácias e drogarias. Um dos casos mais conhecidos nesta área foi o desenvolvimento da anestesia, utilizada atualmente em todos os procedimentos cirúrgicos, que teve a sua origem no “curare”, um composto utilizado por várias etnias indígenas, no exercício da caça.

A CONTRIBUIÇÃO ÀS ARTES E AO LÚDICO

Apesar desse aspecto não ser jamais enaltecido pelas mídias, os povos indígenas contribuíram imensamente com as artes nacionais, como os trançados em fibras, a tecelagem, a cerâmica, além das festas tradicionais e dos ritmos.  Se observarmos os ritmos das músicas nordestinas e nortistas, largamente difundidas por todo o país, como o coco, baião, xaxado, lambada, carimbó, veremos uma forte influência dos ritmos indígenas. No carnaval carioca (e de outras regiões), de onde teriam vindo os enormes cocares de penas usados por todas as escolas de samba que desfilam na Sapucaí, senão dos povos indígenas?

TODOS FOMOS COLONIZADOS PELOS INDÍGENAS

Segundo a interpretação de Darcy Ribeiro, o sociólogo Gilberto Freire, em seu livro Casa Grande & Senzala, teria reconhecido que se os europeus colonizaram os territórios indígenas, os brasileiros foram “colonizados” culturalmente pelos indígenas. De fato, os europeus, entre maravilhados e decepcionados, ainda hoje comentam sobre essa “maneira de ser” do brasileiro, como que resignados por não completar o trabalho colonizador.

A GÉNETICA E O "JEITINHO"

Na verdade, o indígena imprimiu no brasileiro mais do que o traço genético, que segundo pesquisas realizadas pela UFMG ainda prevalece no "sangue" de mais de 60% da população brasileira. Imprimiu também a própria forma de ser, de agir e de compreender o mundo. O modo descontraído e alegre, a hospitalidade, o espírito pacifista e gregário, a impontualidade, o planejamento em cima da hora, o “jeitinho” para resolver as coisas, entre outras marcas da brasilidade, são legados essencialmente indígenas, reforçados pelas influências negras.

Então, por que os brasileiros resistem em reconhecer a influência indígena na cultura nacional em seu sentido mais amplo? Isso, com certeza, tem a ver com as informações transmitidas nas escolas, que continuam a colocar os indígenas como um elemento histórico do passado, e pelos veículos de comunicação de massa, para os quais os povos indígenas são invisíveis, exceto quando são alvos de notícias negativas. 

ELES TEIMAM EM OCUPAR SUAS PRÓPRIAS TERRAS

Em nosso entendimento, isso ocorre porque os indígenas “teimam” em garantir a posse de suas terras ancestrais, sempre cobiçadas pelo capitalismo, não somente pelas terras em si, mas também pelas suas “riquezas naturais” (madeira, minérios). Além disso, os indígenas também “teimam” em não explorar seus territórios, exatamente porque não são capitalistas. Vejam o exemplo dos negros. Após terminada a escravidão, eles puderam ter reconhecidos seus valores culturais e sua influência na cultura brasileira. Bastou, entretanto, que tivessem alguns territórios “quilombolas” reconhecidos e demarcados nos últimos anos para que voltassem a ser discriminados como “improdutivos”, inclusive pelo poder governamental.

QUANDO SEREMOS REALMENTE UM PAÍS?

O Brasil jamais será um país de fato se continuar negando suas origens, inclusive a negra e a europeia, e a sua genuína maneira de ser, negando sua imensa e riquíssima diversidade cultural.
Quanto aos indígenas, eles não querem muito. Pedem apenas respeito à sua ancestralidade na ocupação deste país e ao direito de viver em paz no que restou de suas terras, segundo seus costumes, crenças e tradições, como está estabelecido nos artigos 231 e 232 da Constituição Federal.
                                                                                                          *Indigenista e Escritor

1 de fev. de 2020

NOTA DO CIMI

Nota do Cimi: com política inconstitucional, governo Bolsonaro pode provocar etnocídio e genocídio de povos isolados e de recente contato no Brasil
 
No Brasil existem, aproximadamente, 114 povos indígenas isolados
Conselho Indigenista Missionário - Cimi
O Conselho Indigenista Missionário – Cimi manifesta grave preocupação e repudia veementemente as recentes iniciativas do Governo Bolsonaro que afrontam a Constituição Brasileira e a política sobre povos indígenas isolados e de recente contato no Brasil.
O governo Bolsonaro dá evidentes sinais de abandono à perspectiva técnico-científica, do respeito ao direito de existência livre desses povos, com seus próprios usos, costumes, crenças e tradições, em seus territórios devidamente reconhecidos e protegidos (CF Art. 231), para uma orientação neocolonialista e etnocida, de atração e contato forçados, com o uso do fundamentalismo religioso como instrumento para liberar os territórios destes povos à exploração por grandes fazendeiros e mineradores.
Ao adotar este direcionamento, o governo Bolsonaro e os grupos econômicos e ‘investidores’ beneficiários desta política assumem, conjuntamente, a responsabilidade pelo potencial e iminente genocídio e etnocídio de povos indígenas no Brasil.
O Cimi também repudia as agressões verbais do presidente Bolsonaro à entidade, demonstração de completo despreparo e desequilíbrio emocional do mesmo, que servem de incentivo às ameaças e violências contra membros da organização que atuam junto aos povos em todas as regiões do Brasil. Mesmo diante dessas intimidações, o Cimi reafirma o compromisso inarredável e solidário com a vida, os direitos e os projetos de futuro dos povos originários do Brasil.
Brasília, 31 de janeiro de 2020
Conselho Indigenista Missionário (Cimi)

COMUNICADO DE IMPRENSA


COMUNICADO DE IMPRENSA DA SURVIVAL INTERNATIONAL

“Um plano genocida”: a Survival reage a nova proposta para a Funai

31 de janeiro, 2020

Ricardo Lopes Dias, o missionário proposto como novo coordenador geral do departamento de índios isolados da Funai. © Ricardo Lopes Dias
O governo do Presidente Jair Bolsonaro propôs o missionário evangélico, Ricardo Lopes Dias, para comandar a Coordenação Geral de Índios Isolados e de Recente Contato (CGIIRC) da FUNAI. Lopes Dias trabalhou muitos anos com a Missão Novas Tribos do Brasil (MNTB), agora conhecida também como Ethnos360.

A notícia da nomeação de Lopes Dias está causando indignação ao redor do mundo.
A COIAB, Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira, afirmou em nota: “Nossas famílias sofreram historicamente com a atuação de missionários proselitistas - muitos deles da Missão Novas tribos do Brasil (MNTB) - que fizeram contato forçado com nossos avôs e avós. O contato forçado foi feito através de mentiras, violência e ameaças de morte.”

Sarah Shenker, da Survival International, o movimento global pelos direitos dos povos indígenas, disse hoje: “Colocar um missionário evangélico no comando do Departamento de Índios Isolados da FUNAI é como colocar uma raposa no galinheiro. É uma agressão, uma declaração de que eles querem entrar em contato com povos indígenas isolados à força, o que os destruirá. Juntamente com a recente proposta do presidente Bolsonaro de abrir terras indígenas para mineração e exploração, este é um plano genocida para a destruição total dos povos mais vulneráveis do planeta cuja sobrevivência está agora em risco. Nós resistiremos com todo o nosso poder, junto com nossos amigos indígenas do Brasil.”
Os indígenas isolados são os povos mais vulneráveis do planeta. ©G Miranda/ FUNAI/ Survival
A Missão Novas Tribos é conhecida em todo o mundo por suas tentativas de forçar o contato e evangelizar povos indígenas isolados. É uma das organizações missionárias mais extremistas, cujas missões no Paraguai levaram a várias mortes durante as décadas de 1970 e 1980.