30 de abr. de 2018

ACAMPAMENTO TERRA LIVRE 2018

Documento final do ATL 2018 – O nosso clamor contra o genocídio dos nossos povos
Completados 30 anos da CF de 1988, que consagrou a natureza pluriétnica do Estado brasileiro, os povos indígenas vivem o cenário mais grave de ataques aos seus direitos
Depois de 518 anos, as hordas do esbulho, da acumulação e do lucro continuam massacrando e exterminando os nossos povos para tomar conta de nossas terras e territórios, dos bens comuns e de todas as formas de vida que, milenarmente, soubemos proteger e preservar.

Completados 30 anos da Constituição Federal de 1988, que consagrou a natureza pluriétnica do Estado brasileiro, os povos indígenas do Brasil vivem o cenário mais grave de ataques aos seus direitos desde a redemocratização do país. Condenamos veementemente a falência da política indigenista, efetivada mediante o desmonte deliberado e a instrumentalização política das instituições e das ações que o Poder Público tem o dever de garantir.
O direito originário sobre nossas terras, assegurado como cláusula pétrea pelo Artigo 231 da Constituição, vem sendo sistematicamente violado pelos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, não apenas com a completa paralisação das demarcações das terras indígenas, mas também mediante a revisão e a anulação dos processos de reconhecimento dos nossos direitos territoriais.
Ao negociar nossos direitos com bancadas parlamentares anti-indígenas, especialmente a ruralista, o governo ilegítimo de Michel Temer publicou o Parecer AGU nº 001/2017, que, de forma inconstitucional e contrária à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), tenta impor a tese do marco temporal, uma das mais graves violações contra os nossos povos. Sua condenável utilização tem servido para o retardamento dos já morosos processos de demarcação e, em determinados casos, para a anulação de demarcações já efetivadas e consolidadas. A tese desconsidera o histórico de expropriação territorial e de violência a que muitos dos nossos povos foram submetidos, durante séculos, inclusive na ditadura militar, como denuncia o relatório da Comissão Nacional da Verdade.
No âmbito do Poder Judiciário, tramitam milhares de ações propostas pelos nossos inimigos, estimuladas nos últimos tempos pela tese do marco temporal, e que tem o objetivo de suprimir o nosso direito territorial sem que possamos exercer o direito de acesso à justiça para a defesa dos nossos direitos.
Não aceitamos o loteamento político da FUNAI, especialmente para atender interesses da bancada ruralista e demais setores anti-indígenas, como as últimas nomeações de presidentes, incluindo a do Sr. Wallace Moreira Bastos, cujo currículo denota completa ignorância das questões indígenas. Igualmente, condenamos o intencional desmantelamento do órgão indigenista, com reduções drásticas de orçamento, que inviabiliza o cumprimento das suas atribuições legais, especialmente no que toca a demarcações, fiscalização, licenciamento ambiental e proteção de povos isolados e de recente contato. Na mesma toada, foram extintos espaços importantes de participação e controle social, principalmente o Conselho Nacional da Política Indigenista (CNPI).
Não bastasse isso, denunciamos o fisiologismo entre o governo federal e o Congresso Nacional e o desmonte deliberado do Estado brasileiro provocado pela Emenda Constitucional 95, que congela o orçamento por 20 anos. Destacamos a absoluta falta de implementação da PNGATI nos territórios, a extinção do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e da Assistência Técnica Rural (Ater Indígena). Tais omissões impedem as imprescindíveis ações de etnodesenvolvimento, gestão ambiental e proteção das terras indígenas, resultando na intensificação da presença de atividades ilegais e danosas, como garimpo, exploração madeireira, arrendamento, loteamento, comercialização e apossamento de terras já demarcadas por não indígenas; tráfico de conhecimentos tradicionais e outras ameaças.
Denunciamos, ainda, a situação de calamidade da saúde indígena, fruto da precariedade do atendimento básico, do desrespeito às particularidades de cada povo indígena, da desvalorização da medicina tradicional, da falta de acesso a medicamentos e ao transporte para a realização de tratamentos, situação agravada pela utilização político-partidária da política e das instâncias responsáveis pela gestão da saúde indígena. Da mesma forma, denunciamos o descaso com a educação escolar indígena, manifesta na falta de respeito ao projeto pedagógico de cada povo, no não reconhecimento da categoria de professores indígenas, na falta de apoio à formação continuada desses professores, incluindo as licenciaturas interculturais, e na má qualidade das estruturas das escolas, ou na falta destas nas comunidades, bem como a falta de material didático compatível com as especificidades.
A atual conjuntura ainda impõe sérios riscos de retrocesso na legislação de proteção aos direitos dos povos indígenas. Para além do sempre presente fantasma da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, os esforços da bancada ruralista voltam-se no momento para uma tentativa de legalizar o arrendamento das terras indígenas, afrontando o direito constitucional ao usufruto exclusivo dos povos indígenas sobre suas terras. Recorrem para isso a estratégias de desinformação e tentativas de divisão de povos e comunidades. Também está nessa agenda uma série de propostas de flexibilização do licenciamento ambiental voltadas a liberar empreendimentos em nossos territórios, como o PLS 654/2015, o PLS 168/2018 (ambos no Senado) e o Projeto de Lei (PL) 3729/2004 (Câmara dos Deputados). Não admitiremos a desconsideração de povos indígenas isolados, a restrição de avaliação de impactos ambientais apenas para terras indígenas homologadas, o caráter não vinculante da manifestação da FUNAI e a concessão automática de licença quando superado o prazo para manifestação do órgão indigenista, entre outras.
É esse contexto de hegemonia dos ruralistas e outros inimigos dos povos indígenas, em todos os poderes do Estado, que provoca o acirramento sem precedentes da violência contra os nossos povos e a criminalização das nossas lideranças que estão na frente das lutas de defesa dos nossos direitos, situação agravada pelo desmonte das instituições que tem o dever constitucional de proteger e promover os direitos indígenas.
Diante desse quadro sombrio de extermínio dos nossos direitos, nós, cerca de 3.500 lideranças indígenas, representantes dos mais de 305 povos indígenas de todas as regiões do país, reunidos no Acampamento Terra Livre 2018, exigimos das instâncias de poder do Estado o atendimento das seguintes reivindicações:
  1. Revogação imediata do Parecer 001/2017 da AGU / Temer;
  2. Revogação imediata da Emenda Constitucional 95, que congela para os próximos 20 anos o orçamento público;
  3. Realização urgente de operações para a retirada de invasores de terras indígenas já demarcadas e a efetiva proteção das mesmas;
  4. Demarcação e proteção de todas as terras indígenas, com especial atenção às terras dos povos isolados e de recente contato, assegurando o fortalecimento institucional da FUNAI;
  5. Dotação orçamentária, com recursos públicos, para a implementação da PNGATI e outros programas sociais voltados a garantir a soberania alimentar, a sustentabilidade econômica e o bem viver dos nossos povos e comunidades;
  6. Garantia da continuidade do atendimento básico à saúde dos nossos povos por meio da SESAI, considerando o controle social efetivo e autônomo por parte dos nossos povos;
  7. Efetivação da política de educação escolar indígena diferenciada e com qualidade, assegurando a implementação das 25 propostas da segunda conferência nacional e dos territórios etnoeducacionais;
  8. Arquivamento de todas as iniciativas legislativas que atentam contra os nossos povos e territórios;
  9. Garantia por parte das distintas instâncias do poder Judiciário da defesa dos direitos fundamentais dos nossos povos assegurados pela Constituição Federal e os tratados internacionais assinados pelo Brasil;
  10. Fim da violência, da criminalização e discriminação contra os nossos povos e lideranças, assegurando a punição dos responsáveis por essas práticas, a reparação dos danos causados inclusive por agentes do Estado e comprometimento das instancias de governo (Ministério de Direitos Humanos, Ministério da Justiça, Defensoria Pública) na proteção das nossas vidas;
  11. Aplicabilidade dos tratados internacionais assinados pelo Brasil, de modo especial a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) incorporada ao arcabouço jurídico do país e que estabelece o direito dos povos indígenas à consulta livre, prévia e informada sobre quaisquer medidas administrativas ou legislativas que os afetem.
Brasília – DF, 26 de abril de 2018
Articulação dos Povos Indígenas  do Brasil –APIB
Mobilização Nacional Indígena

15 de abr. de 2018

MOBILIZAÇÕES INDÍGENAS 2018


Povos Indígenas, em parceria com movimentos sociais do Estado de Tocantins se mobilizam por garantias de direitos

Neste mês de abril de 2018, estão acontecendo mobilizações indígenas em todo o Brasil.  Neste período as demais organizações da sociedade civil organizada do campo e das cidades também estão mobilizadas por garantias de políticas públicas de saúde, educação, territórios, meio ambiente e outros, num contexto de retrocessos políticos e ameças aos direitos civis da população brasileira.

Essas mobilizações fazem parte das atividades da Semana dos Povos Indígenas 2018, promovidas pelo Conselho Indigenista Missionário-CIMI, que esse ano debate o Tema: "Justiça, Terra e Paz para os Povos Indígenas". No Estado de Tocantins estão acontecendo na cidade de Palmas Seminários, atos públicos, palestras e manifestações indígenas no MPF, Universidades, Escolas e locais públicos. Estão mobilizados neste período representantes dos povos Apinajé, Krahô, Xerente e Carajá, junto com organizações da sociedade civil.

Na manhã de 13/04/18, aconteceu audiência no MPF-TO em Palmas, com representantes do Distrito Sanitário Especial Indígena do Tocantins - DSEI-TO, que tratou do atendimento à saúde indígena dos povos do Estado do Tocantins. As lideranças denunciaram as demoras e morosidade no atendimento, especialmente encaminhamentos para realizações de consultas e exames médicos especializados. Os lideranças relataram que muitos indígenas estão morrendo de doenças cardíacas, renais e respiratórias por falta de tratamento preventivo, negligencias e demoras no atendimento.

Audiência na PR/MPF-TO, em Palmas, debate questão das terras indígenas. (foto: Antonio Veríssimo. Abril 2018)
No período da tarde do dia 13/04, o MPF-TO promoveu audiência com representantes do IBAMA, NATURATINS, FUNAI e lideranças indígenas sobre a fiscalização, proteção e demarcação das terras indígenas. Nesta reunião os representantes indígenas denunciaram as invasões das terras, os desmatamentos, poluição das águas e roubo de recursos naturais. As lideranças culparam o alinhamento do governo de Michel Temer com ruralistas, como principal causa do sistemático abandono e sucateamento da FUNAI. As lideranças questionaram ainda o procedimento de licenciamento dos empreendimentos que afetam terras indígenas, conduzido pelo NATURATINS, sem a efetiva participação da FUNAI, IBAMA e MPF, e reclamaram que também não estão sendo ouvidos e nem consultados nos processos. As autoridades também foram cobradas sobre a situação das estradas e pontes de acesso às aldeias.

Um Seminário à noite realizado na Universidade Católica em Palmas, teve importante presença de acadêmicos, professores, representantes de movimentos sociais, missionários, ativistas, ambientalistas, políticos, além dos povos indígenas.  Neste evento na Católica destacou-se a importância das iniciativas locais e lutas coletivas em defesa de nossa Casa Comum, ameaçada pela ganancia e inconsciência de alguns. Noeli Maria Stürmer da Associação Água Doce, apresentou a luta da sociedade civil organizada da cidade de Palmas e entorno, em defesa do rio Taquaruçu Grande, que abastece a população de Palmas, cujas nascentes estão sendo destruídas pela ação irresponsável do desmatamento para plantio de soja.
Plenária do Seminário que debateu a questão dos agrotóxicos. (foto: Antonio Veríssimo. Abril de 2018)
Os Impactos do Agrotóxicos na Saúde Humana, foi assunto debatido no Seminário realizado no dia 14/04 no Colégio Marista. O professor Jackson Rogério Barbosa da UFMT, apresentou dados e esclarecimentos importantes sobre as graves doenças e transtornos que os agrotóxicos estão causando na vida das pessoas e nos demais seres vivos; animais e vegetais. Alertou que os Agentes de Saúde e Médicos no Brasil não estão preparados para analisar essas doenças. O prof. Jackson, que é estudioso e pesquisador do assunto afirmou que os agrotóxicos provocam câncer, aborto e má formação de fetos. Lembrou que o Mato Grosso, considerado a capital do agronegócio brasileiro, é o maior consumidor de agrotóxico do Brasil, e que no estado do MT, a água, o ar, o solo, os rios, os peixes, os alimentos e as pessoas estão contaminados por agrotóxicos.

Durante os debates o prof. Jackson foi indagado em vários momentos pelos participantes que queriam saber mais sobre os agrotóxicos. No caso do Estado do Tocantins, declarou que o “projeto MATOPIBA é uma estratégia para acabar a última área de Cerrado do Brasil”. Que os povos indígenas, camponeses, quebradeiras de coco, quilombolas e populações urbanas devem se mobilizar para impedir que o Tocantins seja transformado em um (outro) Mato Grosso.

O encerramento aconteceu no final do dia e início da noite de 14/04, com um Sarau no Parque dos Povos Indígenas na cidade de Palmas, aonde tivemos danças tradicionais dos indígenas, poesias, músicas e outras manifestações políticas em defesa das nascentes do rio Taguaruçu Grande e demais rios da bacia hidrográfica Tocantins/Araguaia. As atividades da Semana dos Povos Indígenas 2018 continuarão a partir de amanhã 16/04, com atos em Goiânia, Brasília, Palmas e demais cidades do país.

Palmas-TO, 15 de abril de 2018

Associação União das Aldeias Apinajé-Pempxà