Manifesto dos Cursistas do PNGATI-Cerrado
Para a Srª Victoria Tauli-Corpuz
Relatora Especial da ONU sobre Direitos dos Povos Indígenas.
Nós, lideranças indígenas representantes dos povos Terena
(MS), Xavante (MT), Makuxi (RR), Guajajara, Gavião e Krikati (MA), Yudjá, Mundurukú e Kayapó
Mentuktire (PA), Apinajé, Xerente, Karajá e Karajá Xambioá (TO) e servidores da
Fundação Nacional do Índio (FUNAI) cursistas do 4ª Módulo do Curso Básico de
Formação em PNGATI para o Cerrado, que está sendo realizado no período de 14 a
19 de março de 2016 em Brasília (DF), viemos manifestar nossa preocupação com a
atual conjuntura da política indigenista do Brasil e denunciar as graves
violações contra nossos direitos constitucionais perpetradas por setores
anti-indígenas com a conivência e a participação do estado brasileiro.
Nos últimos anos, temos verificado o aumento de ataques da
classe dominante, que organiza e promove a prática da violência deliberada
contra nossa dignidade e nossas vidas nas terras indígenas e nas cidades. Essas violências e abusos contra os povos indígenas acontecem por várias alegações e motivos
diferentes, seja por preconceito, intolerância, ignorância e racismo.
Entretanto, alguns dos principais motivos dessa onda de violência são os conflitos
fundiários, ambientais e sociais que estão ocorrendo em todas as regiões do
Brasil por falta de demarcação e proteção dos territórios indígenas.
Agora, após 516 anos de invasão, continuamos sendo agredidos
pela colonização moderna. Empobrecidos e tratados como estrangeiros, muitos
povos e suas lideranças estão sendo vítimas de perseguições, criminalizações,
assassinatos, prisões, espancamentos, despejos e doenças. As políticas
governamentais insuficientes, equivocadas e omissas têm trazido morte,
desesperança e sofrimento para nossos povos, especialmente nos estados de Mato
Grosso do Sul, Bahia, Pará, Maranhão, Tocantins, Santa Catarina e Rio Grande do
Sul.
Atualmente, tramita na Câmara dos Deputados a Proposta de
Emenda à Constituição (PEC) 215/2000, que propõe transferir do Poder
Executivo para o Poder Legislativo a competência de demarcar e regularizar as
terras. Ressaltamos que atualmente a Câmara dos Deputados e o Senado Federal
são dominados pelo agronegócio, pelas mineradoras e madeireiras, setores que
historicamente vivem massacrando nossos povos, roubando e usurpando nossos
territórios.
É preocupante a intenção do governo de implantar o MATOPIBA.
Esse mega programa de “desenvolvimento” representa uma séria e grave ameaça à
vida dos povos indígenas que vivemos há séculos preservando o
Cerrado. Constatamos que as regiões que compreendem os Estados de Maranhão,
Tocantins, Piauí e Bahia vêm sendo alienadas e entregues às grandes
multinacionais do Japão, Estados Unidos e Europa para plantio de grãos em larga
escala. Tudo em detrimento à vida e ao futuro de centenas de comunidades que
sequer estão sendo consultadas, ouvidas e/ou informadas que vão ser expulsas
para a implantação do Programa.
Avaliamos que se esse mega projeto financiado com recursos
públicos for implantado, será o fim desse importante ecossistema que abriga
milhares de espécies de nossa fauna e flora, sendo responsável também pela
garantia e manutenção de importantes mananciais e nascentes de águas formadoras
das principais bacias hidrográficas do São Francisco, Parnaíba, Araguaia/ Rio
das Mortes, Tocantins, Xingú, Tapajós e Teles Pires.
Denunciamos os projetos e a construção de grandes
hidrelétricas em nossos rios no Cerrado e na Amazônia, onde milhares de ribeirinhos,
agricultores familiares, populações quilombolas e povos indígenas estão sendo
brutalmente atingidos e expulsos pela implantação de grandes empreendimentos
hidrelétricos apoiados pelo governo brasileiro, muitos implantados de forma
ilegal e sem consultas às populações ameaçadas, atingidas e impactadas.
Dessa forma, o governo brasileiro não está cumprido a
Convenção 169 da OIT e nem observando as recomendações da Declaração da ONU
sobre os Direitos dos Povos Indígenas. Repudiamos essa postura arrogante e
abusiva de alguns setores governamentais, recorrentes descumpridores desses
tratados e regras internacionais que o Brasil é signatário.
Setores ruralistas e empresariais também atuam para
enfraquecer e inviabilizar o trabalho da FUNAI de forma que nenhuma terra possa
ser demarcada ou regularizada. Esse órgão indigenista tem sofrido seguidos
cortes em seu orçamento e redução de servidores. Repudiamos os ataques e perseguições do setor
ruralista no Congresso Nacional e na Assembleia Legislativa do Mato Grosso do
Sul por meio das CPIs da FUNAI e do CIMI, com a finalidade de mentir, caluniar
e dificultar a efetivação de demarcação de terras indígenas no país.
Brasília
(DF), 16 de março de 2016
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