Pesquisar este blog

1 de out. de 2025

REDD+

CARTA FINAL DO SEMINÁRIO TOCANTINS NA ENCRUZILHADA: COMBATE AO DESMATAMENTO E ANÁLISE CRÍTICA AO REDD+ JURISDICIONAL


Inspirados e inspiradas pela coragem e ousadia daqueles e daquelas que nos antecederam e pela força ancestral que resiste em nossos territórios, nós, povos Apinajé, Krahô, Xerente, comunidades quilombolas, quebradeiras de coco babaçu, agricultores e agricultoras familiares, camponeses e camponesas, assentados da reforma agrária, pescadores e pescadoras artesanais, juventudes, movimentos sociais, pastorais, sindicatos, pesquisadores, professoras e professores, entidades de apoio e coletivos diversos, reunidos no Seminário Tocantins na Encruzilhada: combate ao desmatamento e análise crítica ao REED+ Jurisdicional, realizado nos dias 25 e 26 de setembro de 2025, em Palmas (TO), tornamos público este grito coletivo de denúncia e de socorro.

Nosso encontro ecoa diante da escolha do Estado brasileiro de transformar o Cerrado em bioma de sacrifício, um território destinado à devastação para alimentar a máquina do agronegócio e da financeirização da natureza. Essa lógica expulsa povos e comunidades de seus lugares de vida, destrói as águas, as florestas e os modos de existência e ameaça a própria continuidade da vida no planeta.

Este documento nasce como voz insurgente diante do desmatamento acelerado, da grilagem institucionalizada, da violência crescente no campo e da tentativa de transformar nossas florestas, rios e territórios, - e até o gás carbônico que evitamos que seja lançado na atmosfera - em mercadorias. Ele expressa nossa indignação, nossa denúncia e, sobretudo, nossos compromissos de luta pela vida e pela preservação do Cerrado, coração das águas do Brasil e morada de nossos povos.

 Denunciamos

A expansão acelerada do desmatamento no Tocantins e no MATOPIBA, intensificado pela expansão desordenada da fronteira agrícola.

O avanço do desmatamento do Tocantins, em especial nas unidades de conservação como a APA Cantão/Ilha do Bananal. Dados revelam que o desmatamento na APA foi maior proporcionalmente do que no restante do Estado do Tocantins, e intensificado de 2012 em diante.

Persistem práticas de emissão de autorizações de supressão de vegetação (ASVs)/AEFs e cobertura nativa, muitas vezes ilegais, conforme apontado no relatório lançado durante o Seminário.

A grilagem e a legalização de terras públicas, expressa na Lei Estadual nº 3.525/2019 e em novos projetos que buscam transferir terras da União para o Estado, abrindo caminho para a concentração fundiária e a exclusão dos povos do campo.

A ausência de transparência dos órgãos de fiscalização, em especial do Naturatins, sem validação das informações do CAR referentes às Reservas Legais, APPs e áreas de sobreposição com as APAS e demais UC e territórios PCTs.

A expansão da soja e da pecuária extensiva como vetores estruturais da destruição, contaminando águas e solos com agrotóxicos, expulsando comunidades tradicionais, povos originários e os povos do campo, inviabilizando a produção da agricultura familiar e afetando a saúde das populações.

O avanço da insegurança hídrica no Tocantins. Observa-se a ausência de gestão realmente participativa da gestão das águas nos territórios, com a concessão de autorizações e outorgas de captação, represamento da água por grandes empreendimentos sem avaliação de impacto, muito menos consultas prévias, livres e informadas para as demais comunidades e territórios que serão atingidos.

A violação ao direito à consulta livre, prévia e informada das comunidades. Seja nos procedimentos de licenciamento ambiental, autorizações de supressão de vegetação, processos administrativos minerários.

O avanço da mineração e de megaprojetos de infraestrutura que agravam os impactos sociais, territoriais e ambientais sobre os territórios.

O aumento da violência policial e da criminalização das comunidades e dos movimentos sociais.

A violência contra comunidades rurais e povos tradicionais, marcada por despejos extrajudiciais, repressão policial e ameaças constantes a defensores de direitos humanos.

A falta de transparência quanto às informações das terras públicas estaduais, sobretudo relacionadas às destinações realizadas pelo Intertins.

A ausência de políticas de regularização fundiária e de proteção efetiva de territórios indígenas, quilombolas e povos do campo.

O esvaziamento institucional e o desprezo pelas pautas de Direitos Humanos por meio do boicote aos espaços de participação social, como as conferências.

O assédio às comunidades e a erosão dos modos de vida sob a promessa de renda que desestrutura a autonomia.

A hegemonia da narrativa pró-agronegócio na mídia (“o agro é pop”) e a disputa simbólica na sociedade onde há uma subalternização das pautas socioambientais.

A ameaça da financeirização da natureza via REED+ jurisdicional e a mercantilização da natureza.

O modelo de REDD+ Jurisdicional, em debate no Tocantins, não enfrenta as causas estruturais do desmatamento, abrindo espaço para a mercantilização da natureza, a violação de direitos e a exclusão das comunidades que historicamente protegem os territórios.

O REDD+ Jurisdicional do Tocantins não obedece os direitos assegurados pela Convenção 169 da OIT, uma vez que não houve consulta prévia, livre e informada. Não foi realizada de forma prévia, uma vez que as negociações sobre o REDD+ iniciaram sem a consulta aos pcts, a venda dos créditos de carbono já começou a ser realizada, inclusive sem a autorização da Assembleia Legislativa e a empresa certificadora e sua metodologia de mensuração já estão definidos. Somente em 2025, documentos foram liberados à ATA e somam muitas páginas, impedindo uma compreensão realmente informada para uma decisão livre.

O REDD+ Jurisdicional ignora os direitos territoriais dos PCTs, que estão sendo sistematicamente desrespeitados pelo Estado do Tocantins.

Diante deste cenário, afirmamos o nosso compromisso coletivo com:

A defesa do direito à terra e ao território como condição central para combater o desmatamento e garantir a soberania.

A afirmação de que não há justiça climática sem justiça fundiária.

O reconhecimento dos povos indígenas, quilombolas, camponeses, quebradeiras de coco e comunidades tradicionais como guardiões e guardiãs do Cerrado e parte da solução da crise climática. O Cerrado não será o bioma do sacrifício!

O fortalecimento das redes de incidência política, a articulação dos planos estaduais de agroecologia e a ampliação de práticas agroecológicas como alternativas reais ao agronegócio.

O fortalecimento da juventude, das mulheres e da ancestralidade como pilares da luta.

Nos comprometemos, a partir desse Seminário, com os seguintes encaminhamentos:

Suspender a implementação do REED+ jurisdicional até que haja consulta livre, prévia e informada, e revisão crítica das salvaguardas.

Revogar leis inconstitucionais de grilagem (Lei 3.525/2019) e bloquear novos PLs que transfiram terras da União para os estados.

Revogar normas pró-grilagem e resistência a PLs federais que afrouxam o controle.

Transparência fundiária plena por meio da criação de uma plataforma pública de dados (situação dominial, processos, sobreposições, etc) para controle social.

Regularização fundiária, reconhecimento e titulação de territórios tradicionais, medida essencial para a proteção dos modos de vida e para a garantia de direitos.

Apoio à minuta de Decreto já apresentada ao Governo Federal, que trata da regularização fundiária dos territórios tradicionais, como ação urgente contra a grilagem e a violência no campo.

Apoio a criação de um zoneamento agroecológico e zonas de exclusão/limitação para a mineração e o agronegócio.

Criação de observatório.

Garantir a transparência e controle social sobre as Autorizações de Supressão de Vegetação (ASVs), conforme determinações do STF nas ADPFs 743 e 760.

Fiscalização efetiva e responsabilização dos agentes do desmatamento ilegal, assegurando que a lei seja aplicada sem seletividade.

Fortalecimento da agricultura familiar e camponesa, da agroecologia e das práticas sustentáveis como pilares do desenvolvimento socioambiental do estado.

Criar e implementar um Plano Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica, com recursos garantidos e participação social, integrando assistência técnica, compras públicas, cadeias de valor agroextrativistas e educação do campo.

Apoiar políticas públicas estruturantes: assistência técnica, educação do campo, saúde, fortalecimento de cadeia agroextrativistas.

Fortalecimento da agricultura familiar e camponesa, da agroecologia e das práticas sustentáveis como pilares do desenvolvimento socioambiental do estado. Nossos territórios, práticas agroecológicas e conhecimentos tradicionais representam alternativas reais ao modelo predatório do agronegócio e devem ser reconhecidos e fortalecidos.

Garantir a participação efetiva das comunidades em processos de licenciamento ambiental e decisões que impactam os territórios.

Fortalecimento e criação de instâncias de participação social como os conselhos, as conferências, o fórum de participação social, as associações nos territórios.

Garantir conferências e processos participativos reais com convocação adequada, garantia da logística e mobilização territorial.

Campanha de comunicação para “reflorestar mentes” e disputar a narrativa com conteúdos acessíveis, formação política e alianças no âmbito dos três poderes nos três níveis.

Fortalecer a construção dos protocolos comunitários de consulta e organização em rede para o enfrentamento direto às denúncias aqui apresentadas.

Implementação de um mecanismo de vigilância em saúde para os impactos relacionados ao uso de agrotóxicos e às atividades minerárias com atenção especial aos territórios afetados.

Fortalecer e reestruturar o Incra, Funai, Ibama, ICMBio, Prevfogo, Naturatins com concursos, capacitação e orçamento.

Assistência técnica e extensão rural contínua a assentados e agricultores familiares para reduzir a vulnerabilidade ao arrendamento e a dependência de agrotóxicos.

Monitoramento e pressão sobre as decisões do STF e cobrança de cumprimento pelo estado.

Popularizar ferramentas de denúncia e rastreabilidade, fomentando boicotes, pressão econômica e devida diligência de empresas.

Chamamento ao Poder Público

O Tocantins está em uma encruzilhada histórica: aprofundar a destruição de seus ecossistemas ou construir um futuro de justiça socioambiental, baseado na democracia, na valorização da diversidade cultural e na defesa da vida.

Conclamamos o Governo do Estado, a Assembleia Legislativa e demais instituições públicas a se posicionarem de forma clara contra o desmatamento e em favor dos povos do campo, da floresta e das águas. O futuro do Tocantins depende de escolhas firmes e justas hoje.

Não aceitaremos retrocessos nem falsas soluções!

Não há justiça climática sem justiça fundiária: a defesa da terra e do território é condição central para enfrentar o desmatamento e garantir soberania e segurança alimentar.

Assinam:

Coalizão Vozes Do Tocantins Por Justiça Climática

Instituto Sociedade População e Natureza – ISPN

Tamo De Olho

Núcleo Universidade De Brasília – UnB

Movimento Dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST

Alternativas Para A Pequena Agricultura No Tocantins - APA-TO

Articulação Tocantinense De Agroecologia – ATA

Coordenação Estadual Das Comunidades Quilombolas Do Tocantins – COEQTO

Grupo De Trabalho Amazônico – GTA

Associação De Mulheres Agroextrativistas da APA Cantão - AMA Cantão

Associação Indígena Apinajé - Pyka Mex

Curso De Direito UFT/Arraias

Núcleo De Estudos Em Agroecologia e Desenvolvimento Sustentável - NEADS/UFT

Associação De Apoio Às Unidades De Conservação Onça D’água

Associação Indígena Mē Hempej Xà

Associação União Das Aldeias Apinajé PEMPXÀ

Associação Das Mulheres Xerente

Observatório De Conflitos Socioambientais do MATOPIBA

Instituto Terra, Direitos e Cidadania

Associação Comunitária dos Artesãos e Pequenos Produtores de Mateiros - ACAPPM

REDD+

CARTA FINAL DO SEMINÁRIO TOCANTINS NA ENCRUZILHADA: COMBATE AO DESMATAMENTO E ANÁLISE CRÍTICA AO REDD+ JURISDICIONAL Inspirados e inspirad...