27 de set. de 2019

RESISTÊNCIA


Cacique Raoni: “Minha fala é para o Bem Viver, não ofendo ninguém”

Após ser insultado pelo presidente Jair Bolsonaro na Assembleia Geral da ONU, o cacique pronunciou-se na Câmara dos Deputados e reuniu-se com o presidente da Casa, Rodrigo Maia
Cacique Raoni Kayapó durante entrevista coletiva na Câmara dos Deputados. Foto: Tiago Miotto/Cimi
Cacique Raoni Kayapó durante entrevista coletiva na Câmara dos Deputados. Foto: Tiago Miotto/Cimi
O cacique Raoni Metuktire participou, ontem (25), de uma coletiva de imprensa na Câmara dos Deputados, onde comentou o discurso preconceituoso e agressivo feito na véspera pelo presidente Jair Bolsonaro, na abertura da Assembleia Geral da ONU, em Nova York.
Em meio a ataques aos povos indígenas, os quais, para Bolsonaro, vivem como “homens das cavernas”, o presidente agrediu diretamente Raoni, a quem chamou de “peça de manobra” de governos estrangeiros interessados na Amazônia.
“Bolsonaro falou que eu não sou uma liderança. Ele que não é uma liderança e tem que sair, antes que algo de muito ruim aconteça, para o bem de todos”, afirmou a liderança Kayapó de 90 anos no salão verde da Câmara.
Raoni era aguardado por um grande número de jornalistas e fotógrafos e, assim que chegou, foi cercado por dezenas de apoiadores, que gritaram “Raoni sim! Bolsonaro não!” pelos corredores da Câmara, enquanto Raoni era conduzido até o local da coletiva.
“Meu pensamento é tranquilo, meu pensamento é pela paz. Minha fala é para o Bem Viver, não ofendo ninguém”
Indígenas, apoiadores e parlamentares aliados acompanharam Raoni durante atividades na Câmara dos Deputados. Foto: Tiago Miotto/Cimi
Indígenas, apoiadores e parlamentares aliados acompanharam Raoni durante atividades na Câmara dos Deputados. Foto: Tiago Miotto/Cimi
“Meu pensamento é tranquilo, meu pensamento é pela paz. Minha fala é para o Bem Viver, não ofendo ninguém. Que todo mundo viva com saúde, com tranquilidade”, defendeu Raoni. “Minha luta é em defesa dos povos indígenas, pela sobrevivência dos meus netos e filhos, pelo território, pela nossa vida, pelo meio ambiente”.
Depois da coletiva, o cacique ainda participou de uma reunião do Fórum permanente em defesa da Amazônia, onde parlamentares e membros de organizações da sociedade civil endossaram sua candidatura ao Prêmio Nobel da Paz de 2020, apresentada pela Fundação Darcy Ribeiro.
“Bolsonaro falou que eu não sou uma liderança. Ele que não é uma liderança e tem que sair, antes que algo de muito ruim aconteça, para o bem de todos”
Após coletiva, Raoni participou de reunião do Fórum Permanente em Defesa da Amazônia. Foto: Tiago Miotto/Cimi
Após coletiva, Raoni participou de reunião do Fórum Permanente em Defesa da Amazônia. Foto: Tiago Miotto/Cimi
“Aqui, antigamente, só tinha indígenas. Essa é a história que meu pai e meu avô contavam antigamente. Fazíamos festas, grandes, festas, onde só tinha indígenas. Depois, vieram os colonizadores e dividiram o povo”, lembrou Raoni, durante a reunião do Fórum. “Por isso que digo: vocês, brancos, que atravessaram o oceano para vir ao Brasil, têm que respeitar os povos. Fico triste quando vejo um garimpeiro, um madeireiro, matar um parente, porque isso está acontecendo diariamente em todos os cantos do Brasil com os povos indígenas”.
“Vocês têm que escutar os donos da terra, que permanecemos aqui, e vocês têm que nos respeitar. Eu sou contra a violência, porque isso é ruim. Defendo a paz e a união para todo mundo viver bem”, prosseguiu a liderança, antes de se dirigir aos parlamentares: “Eu sou uma liderança do meu povo, assim como vocês também são lideranças para defender o povo de vocês. Bolsonaro é um louco, mas vou continuar a minha luta. Não aceito a violência”.
“O ataque do Bolsonaro ao cacique Raoni é um ataque à Constituição Federal e ao contrato social que o Estado brasileiro assumiu com os povos indígenas”
Gilberto Vieira dos Santos, do Cimi. Foto: Tiago Miotto/Cimi
Gilberto Vieira dos Santos, do Cimi. Foto: Tiago Miotto/Cimi
Apoio frente aos ataques
Durante o lançamento do relatório Violência contra os Povos Indígenas no Brasil – dados de 2018, realizado nesta terça-feira (24), o presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Dom Roque Paloschi, divulgou uma nota em apoio aos povos indígenas e, especialmente, ao cacique Raoni Metuktire Kaiapó, após os duros ataques proferidos por Bolsonaro perante toda a comunidade internacional.
“A agressividade nos discursos do presidente da República e de membros do seu governo servem de combustível para a violência cometida contra os territórios e a vida dos povos originários”, afirmou Dom Roque.
Representando o Cimi na reunião do Fórum Permanente em Defesa da Amazônia, Gilberto Vieira dos Santos reafirmou a solidariedade ao cacique Raoni e disse que ela expressa também a solidariedade ao conjunto dos povos indígenas do Brasil.
“O ataque que o presidente da República fez ontem ao cacique Raoni e aos povos indígenas foi um ataque ao símbolo que Raoni representa. Se olharmos as fotos do período constituinte, em 1987 e 1988, os povos indígenas vão estar lá, lá vão estar os Mebêngôkre e lá vai estar, de forma muito bonita, o cacique Raoni, marcando a história do Brasil e o contrato social que o Brasil assumiu ao assinar a Constituição de 1988”, afirmou Gilberto.
“O ataque do Bolsonaro ao cacique Raoni é também um ataque à Constituição Federal e ao contrato social que o Estado brasileiro assumiu com os povos indígenas”, prosseguiu o missionário.
Vieira dos Santos citou dados preliminares de 2019 apresentados pelo Cimi, que apontam que o número de terras indígenas invadidas sob os nove primeiros meses do governo Bolsonaro dobrou em relação a todo o ano de 2018 – passando de 76, naquele ano, para 153 em 2019.
“No mandato desse presidente nós já estamos vendo um aumento significativo das invasões às terras indígenas, associado ao discurso que ele tem feito contra os povos”, avaliou Gilberto.
“Nossa intenção é que a gente possa construir projetos que sinalizem aos brasileiros e ao mundo a nossa preocupação com o meio ambiente”
Rodrigo Maia encontra-se com o cacique Raoni na presidência da Câmara. Foto: J. Batista/Câmara dos Deputados
Rodrigo Maia encontra-se com o cacique Raoni na presidência da Câmara. Foto: J. Batista/Câmara dos Deputados
Reunião com Maia
Ainda na tarde de ontem, o cacique Raoni foi recebido pelo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), junto a deputados das frentes parlamentares ambientalista e em defesa dos povos indígenas.
Maia garantiu ao cacique e aos parlamentares que não levará ao Plenário da Câmara projetos que liberem a mineração em terras indígenas – proposta que já está sendo trabalhada pelo governo Bolsonaro – ou que legalizem o roubo de madeira em terras indígenas.
“Nossa intenção é que a gente possa construir projetos que sinalizem aos brasileiros e ao mundo a nossa preocupação com o meio ambiente”, comprometeu-se Maia.
“Bolsonaro desrespeita a nossa condição de sujeitos políticos, de cidadãos plenos e a nossa autonomia, que no seu entendimento só vale se formos nos dobrar aos interesses do capital”, afirma a Apib
Foto: Tiago Miotto/Cimi
Foto: Tiago Miotto/Cimi
Novo ataque e reação da Apib
Após a grande repercussão das falas do cacique Raoni, Jair Bolsonaro respondeu com nova manifestação agressiva e preconceituosa contra a liderança Kayapó. Em novo ataque, Bolsonaro diminuiu a importância de Raoni, afirmando que ele “não fala a nossa língua”.
No mesmo dia, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) divulgou uma nota de repúdio “contra o discurso anti-indígena de Jair Bolsonaro na Assembleia Geral da ONU”, caracterizado pela organização do movimento indígena como “racista e caluniosa”.
“Bolsonaro desrespeita a nossa condição de sujeitos políticos, de cidadãos plenos e a nossa autonomia, que no seu entendimento só vale se formos nos dobrar aos interesses do capital, das corporações nacionais e internacionais, para as quais ele quer entregar as riquezas do país, isso sim, uma verdadeira atitude vende-pátria”, afirma a nota da Apib.
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24 de set. de 2019

VIOLÊNCIA

Solidariedade aos povos indígenas do Brasil diante dos ataques do presidente da República
Durante lançamento do Relatório de Violências do Cimi, dom Roque Paloschi se pronunciou em repúdio ao discurso de Bolsonaro na ONU
Dom Roque Paloschi, presidente do Cimi, destacou as invasões das terras indígenas nestes primeiros dias do ano. Foto: Tiago Miotto/Cimi
Dom Roque Paloschi, presidente do Cimi, destacou as invasões das terras indígenas nestes primeiros dias do ano. Foto: Tiago Miotto/Cimi
Em nome do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) manifesto solidariedade aos povos indígenas do Brasil frente ao discurso agressivo feito pelo presidente Bolsonaro contra os mesmos durante a abertura da Assembleia Geral da ONU, em Nova York, nesta terça-feira, 24.
Manifestamos um desagravo especial ao líder Roani Metuktire Kaiapó, que teve a sua dignidade humana afrontada internacionalmente pelo presidente da República. Ao tratar Raoni e demais lideranças indígenas como manipuláveis, o presidente exala seu pensamento e sentimento preconceituoso e o racismo calcado na falta de conhecimento em relação aos povos indígenas no Brasil ou na sua má fé relativamente ao tema.
A agressividade nos discursos do presidente da República e de membros do seu governo servem de combustível para a violência cometida contra os territórios e a vida dos povos originários, cidadãos e cidadãs de primeira hora de nosso querido Brasil.
Ao cacique Raoni Kaiapó e às demais lideranças e povos indígenas do Brasil, nossa mais profunda solidariedade.
Brasília, 24 de setembro de 2019
Dom Roque Paloschi, presidente do Cimi e arcebisto de Porto Velho (RO)
Fonte: Assessoria de Comunicação - Cimi
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20 de set. de 2019

PBA TIMBIRA


A UHE Estreito: a execução do Programa Básico Ambiental PBA-Timbira na TI. Apinajé

A hidrelétrica de Estreito está localizado nos municípios de Estreito Maranhão e Aguiarnópolis no Tocantins e foi construída pelo Consórcio Estreito Energia-CESTE, composto pelas empresas GDF Suez-Tractebel Energia, Alcoa Alumínio S/A, Vale S/A e Camargo Correia. Foram investidos 5 bilhões de reais no empreendimento, e a energia gerada pela UHE Estreito atende especialmente as demandas do Projeto Siderúrgico Grande Carajás, localizado nos Estados do Pará e Maranhão.

O empreendimento hidroelétrico afetou áreas de Cerrado e floresta amazônica no Norte de Tocantins e Sul do Maranhão. A região faz parte da Amazônia legal, sendo ainda fortemente impactada pelas rodovias Belém-Brasília, Transamazônica (BR 230), TO 126, e pela Ferrovia Norte-Sul, ainda existe a proposta de implantação da hidrovia Araguaia-Tocantins e da hidrelétrica de Marabá. Após a implantação da UHE Estreito, extensas áreas de Cerrado no entorno do território Apinajé, passaram a ser desmatadas para plantio de eucaliptos e implantação de carvoarias. Mas todo o Sul do Maranhão e Norte de Tocantins já vinha sofrendo impactos das carvoarias e plantio de eucaliptos cultivados para atender as demandas da mineradora Vale e da Suzano Papel e Celulose; essa última implantada em Imperatriz – MA em 2013. 

  
O Processo de Licenciamento de UHE Estreito iniciou se em 2001, a implantação do canteiro de obras e o início da construção do empreendimento ocorreu em 2007, a conclusão das obras aconteceu três anos depois, em 2010. Durante esse período ocorreram intensas mobilizações e manifestações dos povos Apinajé, Krahô, Krikati e Gavião, dos ribeirinhos e da sociedade civil organizada questionando a viabilidade ambiental, social e econômica da obra.

Inicialmente o empreendedor só considerou o povo Krahô (TO), localizado a montante como impactado indiretamente pela obra. Em 2002 a Funai solicitou EIA complementar para que assim pudesse emitir um parecer sobre os impactos nas terras indígenas afetadas.  Nesse difícil processo de diálogo e conversas com o empreendedor as articulações do CTI, CIMI e Associação Wyty Cate, foram fundamentais para reconhecimento e inclusão das Terras Indígenas Apinajé (TO), Krikati e Gavião (MA), na condição de impactadas pela empreendimento. 

Durante o tenso processo de implantação da hidrelétrica os (indígenas, camponeses, pescadores e ribeirinhos) atingidos pelo empreendimento estiveram sempre mobilizados para garantir os direitos negados e o justo ressarcimento dos prejuízos sofridos tanto nos territórios e meio ambiente, como no aspecto sociocultural. Nesse sentido realizamos manifestações na Ponte de Estreito em 2009, estivemos mobilizados na marcha e caminhada entre Araguaína -TO e Estreito - MA em 2010, e em algumas ocasiões acampados em frente ao canteiros de obras, buscando sempre dialogar de forma pacífica com o empreendedor.

É importante ressaltar que em todos os momentos de mobilizações, manifestações e lutas por garantias de direitos socioambientais tivemos o acompanhamento e atuação das entidades de defesa dos direitos humanos, da imprensa e do Ministério Público Federal-MPF de Tocantins e Maranhão. Após a conclusão da obra em 2010 houve a liberação das LP-Licença Prévia e LO-Licença de Operação pelo IBAMA, então cada organização e grupo atingido passou a negociar de forma separada com o Consórcio CESTE.

Articulados e mobilizados pela Associação dos Povos Timbira de Maranhão e Tocantins-Wyty Cate, nos anos de 2010 a 2013 as lideranças Apinajé, Krahô, Krikati, Gavião e representantes da Funai e CTI estivemos seguidas vezes reunidos no Centro de Formação Timbira Penxwyj Hempejxà, em Carolina-MA, para discussão e elaboração de um Termo de Compromisso sobre a aplicação dos recursos. Finalmente em outubro de 2013 o referido Documento foi assinado pelo Consórcio CESTE, FUNAI e Wyty Cate, nesse período também foi instituído o Programa Básico Ambiental PBA-Timbira com duração de 10 anos. Após esse período serão realizadas novos estudos e avaliações dos impactos da obra nas comunidades indígenas, com a possibilidade de renovação do Programa. 

A distribuição e partilha dos recursos da referida compensação do AHE Estreito foi definida seguindo critérios de proximidade geográfica da obra, e a intensidade dos impactos sofridos pela etnia atingida. Assim o território Apinajé localizado a apenas 20 km a jusante da obra coube 50% dos recursos, o povo Krahô, ficou com 30% e os povos Krikati e Gavião, 10% cada, totalizando 100%.

O PBA Timbira está sendo implementado na TI. Apinajé desde 2013, e com finalidades de amenizar os referidos impactos do AHE-Estreito no território e nas comunidades atingidas pela construção da hidrelétrica. Até o ano de 2013 existiam apenas 18 aldeias Apinajé, desde então vimos a quantidade de aldeias aumentar de forma acelerada, atualmente são 46 aldeias reconhecidas e atendidas pelo Programa de compensação de Estreito.

Ainda foi instituído o Conselho Gestor do PBA Timbira, com a finalidade de analisar os projetos, aprovar as prestações de contas e o Plano de Trabalho. O Conselho Gestor é composto por 14 membros titulares e 14 suplentes. Sendo 04 membros titulares e suplentes Apinajé, 03 membros titulares e suplentes Krahô, 02 membros titulares e suplentes Krikati e 02 titulares e suplentes Gavião, e ainda 01 titular e suplente da Funai-Sede/BSB, 01 membro titular e suplente da Funai/Coordenação Regional de Palmas e 01 titular e suplente da Funai/CR de Imperatriz. Os membros do Conselho Gestor se reúnem de maneira regular duas vezes por ano. A função do Conselho Gestor ainda é fiscalizar a gestão do Programa e disciplinar e controlar o uso dos veículos, motos, barcos e outros bens adquiridos no âmbito do PBA Timbira.


Desde 2017 que parte dos recursos do PBA Timbira estão sendo administrados pelos próprios Apinajé, com essa finalidade foi criado uma Agencia Implementadora para gerir os recursos. A execução do Programa é orientado por quatro eixos temáticos: Segurança Ambiental, Segurança Cultural, Segurança Alimentar e Apoio Institucional. neste ano 2019 os projetos estão sendo executados nas comunidades desde mês de junho. São 46 aldeias beneficiadas com pequenos projetos de Roças Familiares, Casas de Farinha, Criação de Peixes, e realização de Cerimônias da Cultura. Em 2019 o PBA Timbira está financiando ainda a estruturação das Associações indígenas, realizando Monitoramento Ambiental e Territorial, promovendo a capacitação e formação de novas lideranças.

Nos dias 18 e 19 de setembro 2019, membros da diretoria da Associação Pempxà estivemos reunidos na aldeia Barra do Dia no município de Maurilandia-TO, para análise e avaliação dos projetos implementados até agora e prestação de contas parcial dos recursos aplicados. Ainda durante a Reunião as lideranças confirmaram a realização da 9ª Assembleia Ordinária da Associação Pempxà, no período de 14 a 18 de outubro de 2019 na aldeia Irepxi, sede da Associação Pempxà.

Terra Indígena Apinajé, setembro de 2019

Associação União das Aldeias Apinajé-Pempxà

AGROECOLOGIA


CIMI, Cáritas e Prefeituras apoiam pequenos projetos Agroecológicos em aldeias na TI Apinajé


Em 2018 um projeto da Cáritas Brasileira apoiou a implantação de uma roça de mandioca, macaxeira e milho na aldeia Cocalinho.  O projeto de roça tradicional também teve apoio do Conselho Indigenista Missionário-CIMI, Regional GOTO. Esse projeto visa ajudar na afirmação e segurança alimentar das famílias indígenas que encontram se nesta aldeia Apinajé, localizada na zona rural do município de Cachoeirinha, no Norte de Tocantins.

O Conselho Indigenista Missionário- CIMI, regional Goiás e Tocantins, outra entidade vinculada a CNBB vem apoiando ainda outros projetos de apoio a segurança alimentar na Terra Indígena Apinajé. Neste mês de setembro uma pequena ‘Casa de Farinha’ artesanal está sendo concluída na aldeia Cocalinho. A implantação desse projeto teve início em julho de deste ano. Esse pequeno Projeto é importante pra melhorar e facilitar o processo de fabricação de farinha de mandioca e extração do polvilho, (tapioca) itens fundamentais e básicos na alimentação das comunidades indígenas.

Neste ano de 2019, a Cáritas Brasileiras ainda está apoiando a implantação de uma ‘Casa de Sementes Crioulas’ na aldeia Cocalinho. A implantação desse projeto está em andamento, e sua conclusão prevista para novembro de 2019. A ‘Casa de Sementes’ da aldeia Cocalinho será local de seleção, guarda e conservação de sementes crioulas cultivadas pelo povo Apinajé. Mas os pequenos agricultores familiares (não-índios) da região também serão beneficiados e são parceiros importantes desse projeto. Essa ‘Casa de Sementes’ da aldeia Cocalinho ainda poderá ser referência na coleta, seleção e guarda de sementes das espécies de árvores dos Biomas Cerrado e Amazônia em riscos de extinção por atividades do desmatamentos e incêndios florestais que ocorrem todos os anos nessa região.

Durante Reunião realizada na aldeia São José, no município de Tocantinópolis nos dias 25 e 26 de abril de 2019, para debater propostas e aprovar Plano de Trabalho das Prefeituras para o ICMS –Ecológico de 2019, com presenças dos caciques e lideranças, de representantes das Prefeituras de Tocantinópolis, Maurilândia, São Bento do Tocantins e Cachoeirinha, dos servidores da FUNAI de Palmas e Tocantinópolis, na ocasião foi pautado, debatido e aprovado apoio financeiro da Prefeitura de São Bento do Tocantins para conclusão desse projeto de ‘Casa de Sementes’ na aldeia Cocalinho. A comunidade ainda aguarda a efetivação dessa contribuição da Prefeitura para conclusão do Projeto.

Lembrando que no contexto atual, estamos sofrendo fortes impactos e consequências de desmatamentos, plantações de eucaliptos, incêndios florestais, agrotóxicos e carvoarias implantadas próximos e no entorno da TI Apinajé, e como consequências as nascentes de águas e ribeirões estão sendo assoreadas, envenenadas e secas por essas atividades do agronegócio. Esse projeto ainda será importante para produção de mudas de espécies nativas do Cerrado e Amazônia, que poderão ser aproveitadas para reflorestamento e recuperação das nascentes, áreas de florestas degradadas por incêndios, desmatamentos e (outras) áreas esgotadas por atividades agrícolas.

O povo Apinajé, especialmente as famílias da aldeia Cocalinho agradecemos os parceiros e demais envolvidos na implantação e desenvolvimento desses projetos importantes e necessários para nossas famílias. Lembrando que essas são iniciativas e propostas de nossas próprias comunidades. Em tempos de “crises e dificuldades” criadas por governos, o apoio dessas entidades da Sociedade Civil Organizada são fundamentais para o desenvolvimento social, afirmação sociocultural e garantir a segurança alimentar e nutricional dos povos indígenas. 

Terra Indígena Apinajé, 20 de setembro de 2019 

Associação União das Aldeias Apinajé-Pempxà  


15 de set. de 2019

CIMI

XXIII Assembleia Geral do Cimi elege novo secretariado e divulga documento final
Assembleia Geral do Cimi chega ao fim com prioridades definidas e missionários e missionárias motivados
Da esquerda para a direita: dom Roque (presidente), Irmã Lúcia (vice-presidente) e Antônio Eduardo C. Oliveira (secretário executivo). Crédito da foto: Tiago Miotto/Cimi
POR ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO – CIMI
Dom Roque Paloschi, arcebispo de Porto Velho (RO), foi reconduzido à missão de presidir o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) pelos próximos quatro anos. Os delegados e delegadas da XXIII Assembleia Geral da entidade, que se encerrou na manhã desta sexta-feira (13), elegeram também a nova vice-presidente, Lúcia Gianesini, e o novo secretário executivo, Antônio Eduardo C. Oliveira.
“Me coloco novamente a serviço do Cimi na perspectiva da solidariedade e do compromisso com a causa indígena”, disse dom Roque Paloschi. Para o presidente reeleito do Cimi, o testemunho deve falar mais do que as palavras. “Temos de ter coragem nesse momento de aflição no país, a coragem dos povos indígenas, inclusive na espiritualidade”, afirmou. “No processo de escuta sinodal (Sínodo da Amazônia) ouvimos muitos clamores. Façamos com que a presença do Cimi nas aldeias seja uma presença de esperança, alento e comunhão”.
“Nesses cinco dias de Assembleia fomos despertados pelo testemunho dos povos indígenas e motivados a partir das nossas lutas e sonhos”
Para a vice-presidente do Cimi, Irmã Lúcia, catequista franciscana, com atuação junto ao Cimi Regional Sul – Equipe São Paulo, a Assembleia Geral ocorre em um dos períodos mais obscuros da política nacional, com repercussões extremamente negativas aos povos indígenas, além de muitas incertezas e dor. No entanto, acredita que “é um momento também de renascimento da esperança. Os missionários e missionárias se fortalecem junto aos povos indígenas”.
O encontro foi, sobretudo, a ocasião em que os missionários e missionárias debateram o projeto de transformação social do Cimi. “Nesses cinco dias de Assembleia fomos despertados pelo testemunho dos povos indígenas e motivados a partir das nossas lutas e sonhos. O objetivo foi um só: estabelecer um projeto de vida plena para todos e todas. Saímos com muita disposição para continuar com a nossa caminhada”, afirmou o novo secretário executivo do Cimi, Antônio Eduardo C. Oliveira, que já coordenou o Cimi Regional Leste e atualmente trabalha na região de Itabuna.
No final da manhã desta sexta, o documento final da XXIII Assembleia Geral do Cimi foi lido e aprovado pelos presentes. Leia na íntegra:

Integrantes do Secretariado Nacional do Cimi de ontem, hoje e os eleitos nesta XXIII Assembleia Geral. Crédito da foto: Tiago Miotto/Cimi
Documento Final da XXIII Assembleia Geral do Conselho Indigenista Missionário – Cimi
Tiraram nossas folhas, cortaram nossos galhos, cortaram nossos troncos, mas não arrancaram nossas raízes, por isso resistimos e estamos lutando por nossos direitos”
[Mensagem proferida por lideranças indígenas durante o evento]
O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) realizou, de 09 a 13 de setembro de 2019, em Luziânia, Goiás, a sua XXIII Assembleia Geral, que teve como tema “Em defesa da Constituição, contra o roubo e devastação dos territórios indígenas” e o lema “Alto lá! Esta terra tem dono!”. Esse importante momento de encontro, espiritualidade, análise e reflexão da realidade socioeconômica, política e indigenista contou com a participação de missionárias, missionários, lideranças indígenas, bispos, superioras de congregações religiosas e representantes da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Conferência dos Religiosos do Brasil (CRB), de entidades aliadas, movimentos sociais, pastorais do campo e Ministério Público Federal (MPF).
O Cimi avalia com imensa preocupação a realidade brasileira e denuncia que está em curso um processo de corrosão das políticas públicas, especialmente daquelas destinadas aos mais pobres e aos grupos populacionais historicamente massacrados e discriminados. O governo de extrema direita, conduzido por Jair Bolsonaro, associa-se às grandes corporações transnacionais do capital para organizar o desmantelamento da Constituição Federal de 1988 e a aniquilação de direitos conquistados por meio da luta, da mobilização e da articulação social.
As manifestações públicas do atual governo, com seus discursos de ódio, associadas às suas políticas de desmonte, têm gerado ondas de violência contra os povos, desmatamentos, queimadas, invasões de territórios e a promessa de que não se demarcará nenhum centímetro de terras para os indígenas. Combinado a isso, o governo promoveu a desestruturação da Fundação Nacional do Índio (Funai) deixando-a sem recursos orçamentários para a realização de suas ações de proteção e fiscalização dos territórios. Em pequenas áreas ou acampamentos de comunidades Guarani, Kaiowá, Kaingang e outros povos existe fome em função da paralisação de todos os programas assistenciais. Ou seja, o governo não demarcará as terras e promove a antipolítica indigenista no país.
Há também os retrocessos em relação aos direitos trabalhistas e previdenciários, de acesso à saúde e à educação. Está em curso o dilaceramento da educação universitária pública, o corte drástico no desenvolvimento de pesquisas acadêmicas e científicas, especialmente nas ciências humanas, causando um atraso irreversível do Brasil no concerto das nações. Este (des)governo tem combatido veementemente as políticas de ações afirmativas, as reservas de vagas para pobres, negros e indígenas, além do ingresso e a permanência destes nas universidades.
Essas políticas já estão causando a devastação quase irreversível da natureza, o aniquilamento de comunidades rurais, ribeirinhas, pescadoras, quilombolas, caiçaras e o genocídio de povos indígenas. A expectativa do governo e das empresas exploradoras, que com ele se aliam, é de obtenção de lucros fartos a qualquer custo, e com desastrosas consequências ambientais e humanas. Promove-se a abertura de um novo ciclo de acumulação capitalista, no qual os empresários estão desobrigados de responsabilidades sociais, como a promoção e a proteção da dignidade da pessoa humana e de todos os seres da natureza. Como estratégia, estimula-se a violência, a criminalização e encarceramento de líderes sociais, ambientalistas, indígenas, indigenistas e de políticos que fazem oposição a proposta de governo.
Os discursos e as políticas do presidente da República propagam o ódio e a falsa política associado ao enraizamento, no interior do Poder Executivo, do fundamentalismo ideológico que gera preconceitos, individualismos e alienação, colocando em curso um projeto de aniquilação de direitos individuais e coletivos dos povos originários e tradicionais, de sem terras, sem tetos, mulheres, negros, LGBTQIs e migrantes. Deflagrou-se um processo de perseguição, ameaças e criminalizações de todos os sujeitos que visam construir um mundo plural e democrático, onde os direitos humanos sejam respeitados.
O Cimi, fiel ao Evangelho, se solidariza com todas e todos que estão sendo perseguidos e que têm seus direitos desrespeitados. Se solidariza com os familiares de Maxciel Pereira dos Santos, colaborador da Funai assassinado a tiros em Tabatinga (AM), no Dia da Independência. Ele trabalhava na base de operação indigenista do Vale do Javari, atacada quatro vezes desde 2018, e fiscalizava a ação de invasores à Terra Indígena habitada, inclusive, por povos livres. Da mesma forma, repudia os sucessivos ataques sofridos pelos indígenas Guarani Kaiowá do tekoha – lugar onde se é – Nhu Vera, em Dourados, que na madrugada do dia 12 de setembro foram atacados a tiros, deixando vários feridos, inclusive com armas de fogo. Segundo informações dos indígenas, são capangas de pequenos sítios localizados próximos a retomada, que estão agindo contra a comunidade.
O Cimi se solidariza com os povos, comunidades e suas lideranças e aliados que sistematicamente sofrem ataques contra seus corpos e têm seus territórios devastados pelos agrotóxicos que envenenam as terras, rios e lagos, pela invasão de fazendeiros, grileiros, madeireiros, garimpeiros, pelas hidrelétricas, pelo hidronegócio ou quando suas matas são consumidas por incêndios criminosos. As terras indígenas são bens da União e, portanto, cabe a ela protegê-las. E se há qualquer iniciativa de violação da soberania, com a entrega de terras indígenas para países ou empresas estrangeiras, essa violação é do governo e não dos povos que têm, pela Constituição Federal, o direito ao usufruto exclusivo das áreas demarcadas.
Vive-se um tempo de Kairós, depois do anúncio do Sínodo da Amazônia, momento profícuo de profunda reflexão acerca da defesa dos povos, das culturas e da natureza de toda aquela vasta região e que se constitui num patrimônio do mundo. Em encontro recente com líderes das comunidades amazônicas, o papa Francisco os lembrou: “se, para alguns, sois considerados um obstáculo ou um estorvo, a verdade é que vós, com a vossa vida, sois um grito lançado à consciência de um estilo de vida que não consegue medir seus custos. Vós sois memória viva da missão que Deus nos confiou a todos: cuidar da Casa Comum” (Papa Francisco, dia 19/01/2018, em Puerto Maldonado).
Na XXIII Assembleia Geral se reafirmou o compromisso com as lutas dos povos indígenas pela garantia de seus territórios, a Pacha Mama, e no apoio às suas estratégias de resistência, através de autodemarcações e autoproteção para a manutenção de seus direitos originários, do indigenato, que não foi revogado ao longo dos séculos. Há comprometimento do Cimi com a defesa de suas culturas, línguas, crenças, tradições e organizações sociais.  E, nesse sentido, aprovou como prioridades de ação para os próximos dois anos: terra, água e território; a defesa da Constituição Federal de 1988, com particular atenção à defesa dos direitos originários dos povos indígenas; e apoio aos povos e comunidades que vivem em contextos urbanos.
No entender do Cimi é imperioso que se promovam campanhas no sentido de responsabilizar o governo brasileiro pelas violências que promoveu ao longo dos últimos meses contra os povos indígenas, mas de modo gravíssimo coloca em risco a existência de grupos que vivem em situação de isolamento, numa dolorosa realidade de que povos venham a ser exterminados, configurando-se prática de genocídio. O governo brasileiro incorre em crimes contra a humanidade e contra o meio ambiente, comumente chamado de “ecocídio”. Por tudo isso, o Cimi apoia as iniciativas, em âmbito internacional, no sentido de que se façam sanções aos produtos brasileiros quando produzidos ilegalmente em terras indígenas e a base de práticas criminosas como as queimadas, invasões, arrendamentos e grilagens.
Apesar de todas as violências praticadas contra os povos indígenas, vivemos tempos de discernimento e esperança. Apesar da política de corrosão de direitos e territórios, haverá o tempo de sua retomada e consolidação. Apesar das cinzas da devastação, os povos hão de regar a terra, plantar e colher os seus frutos.
Pela demarcação, proteção e fiscalização dos territórios indígenas, pela titulação dos territórios quilombolas e reforma agrária, por uma agricultura camponesa, em defesa da Constituição Federal e da Vida, seguiremos em marcha, proclamando a Boa Nova da Justiça e Solidariedade universal.
“Somos sementes teimosas” (Rosa Guarasugwe)
Luziânia, Goiás, 13 de setembro de 2019


Fonte: Assessoria de Comunicação - Cimi
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